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Na nossa linguagem está assentada toda uma mitologia.{{hidden|<sup>97</sup>}} | Na nossa linguagem está assentada toda uma mitologia.{{hidden|<sup>97</sup>}} | ||
Exorcismo da morte ou assassinato da morte;{{hidden|<sup>98</sup>}} mas, por outro lado, ela foi representada como um esqueleto, como algo morto em certo sentido. "As dead as death." | Exorcismo da morte ou assassinato da morte;{{hidden|<sup>98</sup>}} mas, por outro lado, ela foi representada como um esqueleto, como algo morto em certo sentido. "As dead as death." 'Nada é tão morto como a morte; nada é tão belo quanto a própria beleza.' A imagem sob a qual se pensa aqui a realidade é a de que a beleza, a morte etc. é a substância pura (concentrada) «são as substâncias puras (concentradas)», ao passo que ela«s» existe«m» como mistura em um objeto belo.{{hidden|<sup>99</sup>}} – Não reconheço aqui minhas próprias observações sobre 'objeto' e 'complexo'?{{hidden|<sup>100</sup>}} {{MS reference|(TS 211, p. 251)}} | ||
Nos antigos ritos temos o uso de uma linguagem de gestos extremamente cultivada.{{hidden|<sup>101</sup>}} | Nos antigos ritos temos o uso de uma linguagem de gestos extremamente cultivada.{{hidden|<sup>101</sup>}} | ||
Quando leio Frazer gostaria de dizer a cada passo: todos esses processos, essas transformações do significado, nós temos ainda diante de nós na nossa linguagem verbal. Quando o que se dissimula no último feixe, no que é chamado de | Quando leio Frazer gostaria de dizer a cada passo: todos esses processos, essas transformações do significado, nós temos ainda diante de nós na nossa linguagem verbal. Quando o que se dissimula no último feixe, no que é chamado de 'lobo do grão', mas também o próprio feixe e o homem que o ata,{{hidden|<sup>102</sup>}} reconhecemos aqui um processo da linguagem bem familiar.{{hidden|<sup>103</sup>}} {{MS reference|(TS 211, p. 281)}} | ||
Eu poderia imaginar que teria tido a alternativa de escolher um ser da terra como moradia para a minha alma, e que meu espírito tivesse escolhido essa criatura pouco vistosa ({{udashed|não-atraente}}) como seu assento e ponto de vista. Talvez porque para ele {{MS reference|(MS 110 p. 253)}} a escolha de um belo assento seria repugnante. Para isso, na realidade, o espírito teria que estar muito seguro de si.{{hidden|<sup>104</sup>}} | Eu poderia imaginar que teria tido a alternativa de escolher um ser da terra como moradia para a minha alma, e que meu espírito tivesse escolhido essa criatura pouco vistosa ({{udashed|não-atraente}}) como seu assento e ponto de vista. Talvez porque para ele {{MS reference|(MS 110 p. 253)}} a escolha de um belo assento seria repugnante. Para isso, na realidade, o espírito teria que estar muito seguro de si.{{hidden|<sup>104</sup>}} | ||
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Poder-se-ia dizer que "toda vista tem a sua sedução", mas isso seria falso. O correto é dizer que toda a vista é significativa para aquele que a vê como significativa (o que não quer dizer que ele a veja como diferente do que é). E neste sentido, toda vista é igualmente significativa.{{hidden|<sup>105</sup>}} | Poder-se-ia dizer que "toda vista tem a sua sedução", mas isso seria falso. O correto é dizer que toda a vista é significativa para aquele que a vê como significativa (o que não quer dizer que ele a veja como diferente do que é). E neste sentido, toda vista é igualmente significativa.{{hidden|<sup>105</sup>}} | ||
Na verdade, é importante que eu também tenha que | Na verdade, é importante que eu também tenha que «↓ me» apropriar do desprezo dos outros por mim, como uma parte essencial e significativa do mundo vista do meu lugar.{{hidden|<sup>106</sup>}} {{MS reference|(MS 110, p. 254)}} | ||
Se uma pessoa tivesse nascido | Se uma pessoa tivesse nascido «↓ se» «deixado nascer» livremente numa árvore de uma floresta: então haveria aqueles que selecionariam a árvore mais bela ou a mais alta, aqueles que escolheriam a mais baixa e aqueles que escolheriam uma árvore média ou menor que uma média; e entendo que eles o fariam não por filistinismo, mas pela razão, ou pelo tipo de razão, pelo qual o outro escolheu a mais alta. Que o sentimento que temos pela nossa vida seja comparável ao da pessoa que pôde escolher o seu ponto de vista no mundo, está na base, creio, do mito – ou da crença – de que escolhemos o nosso corpo antes do nascimento.{{hidden|<sup>107</sup>}} {{MS reference|(MS 110, p. 255)}} | ||
{{leftaside|ø\}} Acredito que o característico do homem primitivo é que ele nunca age por causa de ''opiniões''{{hidden|<sup>108</sup>}} (contra Frazer). Leio, entre muitos exemplos semelhantes, sobre um Rei da Chuva, na África, a quem o povo roga por chuva ''quando chega o período das chuvas''.{{hidden|<sup>109</sup>}} Isso não significa, porém, que eles queiram propriamente dizer que ele possa fazer chover, se não eles o fariam no período mais seco do ano, em que a terra é "a parched and arid desert" (um queimado e árido deserto). Pois ao se admitir que o povo, certa vez, por estupidez, criou este encargo para o Rei da Chuva, nesse caso fica certamente claro que eles já tinham antes a experiência de que a chuva começa em março, e então teriam{{hidden|<sup>110</sup>}} posto o Rei da Chuva para funcionar na parte restante do ano. Ou então: pela manhã, quando o sol estiver por nascer, os homens celebram{{hidden|<sup>111</sup>}} o rito da alvorada, mas não à noite, quando simplesmente acendem as lâmpadas.{{hidden|<sup>112</sup>}} | {{leftaside|ø\}} Acredito que o característico do homem primitivo é que ele nunca age por causa de ''opiniões''{{hidden|<sup>108</sup>}} (contra Frazer). Leio, entre muitos exemplos semelhantes, sobre um Rei da Chuva, na África, a quem o povo roga por chuva ''quando chega o período das chuvas''.{{hidden|<sup>109</sup>}} Isso não significa, porém, que eles queiram propriamente dizer que ele possa fazer chover, se não eles o fariam no período mais seco do ano, em que a terra é "a parched and arid desert" (um queimado e árido deserto). Pois ao se admitir que o povo, certa vez, por estupidez, criou este encargo para o Rei da Chuva, nesse caso fica certamente claro que eles já tinham antes a experiência de que a chuva começa em março, e então teriam{{hidden|<sup>110</sup>}} posto o Rei da Chuva para funcionar na parte restante do ano. Ou então: pela manhã, quando o sol estiver por nascer, os homens celebram{{hidden|<sup>111</sup>}} o rito da alvorada, mas não à noite, quando simplesmente acendem as lâmpadas.{{hidden|<sup>112</sup>}} | ||
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Uma vez que esse fenômeno é colocado em ligação com um instinto que eu mesmo possuo, então é precisamente esta a explicação {{udashed|desejada}} «{{udahsed|almejada}}»; isto é, aquela que resolve o puzzlement (perplexidade) particular «esta {{udashed|dificuldade}} particular». E uma reflexão «pesquisa posterior» sobre a história do meu instinto move-se em outros trilhos.{{hidden|<sup>115</sup>}} | Uma vez que esse fenômeno é colocado em ligação com um instinto que eu mesmo possuo, então é precisamente esta a explicação {{udashed|desejada}} «{{udahsed|almejada}}»; isto é, aquela que resolve o puzzlement (perplexidade) particular «esta {{udashed|dificuldade}} particular». E uma reflexão «pesquisa posterior» sobre a história do meu instinto move-se em outros trilhos.{{hidden|<sup>115</sup>}} | ||
{{leftaside|ø\}} Não pode haver o menor fundamento, isto é, absolutamente nenhum ''fundamento'' para que certas raças humanas venerem o carvalho,{{hidden|<sup>116</sup>}} senão somente a de que eles e o carvalho estivessem unidos em uma comunidade de vida «simbiose»; portanto, não por opção mas porque | {{leftaside|ø\}} Não pode haver o menor fundamento, isto é, absolutamente nenhum ''fundamento'' para que certas raças humanas venerem o carvalho,{{hidden|<sup>116</sup>}} senão somente a de que eles e o carvalho estivessem unidos em uma comunidade de vida «simbiose»; portanto, não por opção mas porque «↓ uniram-se na sua origem», como a pulga e o cão. (Se as pulgas desenvolvessem um rito, ele estaria relacionado ao cão.) {surgiram juntos} | ||
{{leftaside|ø\}} Poder-se-ia dizer que não foi a sua união (entre o carvalho e o homem) o que deu {{udashed|motivo}} a esse rito, senão talvez a sua separação {senão, em certo sentido, a sua separação}.{{hidden|<sup>117</sup>}} | {{leftaside|ø\}} Poder-se-ia dizer que não foi a sua união (entre o carvalho e o homem) o que deu {{udashed|motivo}} a esse rito, senão talvez a sua separação {senão, em certo sentido, a sua separação}.{{hidden|<sup>117</sup>}} | ||
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Aqui a hipótese parece, antes de tudo, dar profundidade à coisa. E pode- se evocar a explicação da estranha relação de Siegfried e Brunilda na nova canção dos Nibelungos. A saber, que Siegfried parece já ter visto Brunilda uma vez antes. É claro agora que o que dá profundidade a esta prática é a sua ''conexão'' com a queima de uma pessoa.{{hidden|<sup>139</sup>}} Se fosse um costume de outro festival, em que os homens (como o jogo do cavaleiro e do corcel) cavalgam uns sobre os outros, então nada veríamos ali senão uma forma de transporte que lembra um homem andando a cavalo; — se, entretanto, soubéssemos que tinha sido o costume de muitos povos | Aqui a hipótese parece, antes de tudo, dar profundidade à coisa. E pode- se evocar a explicação da estranha relação de Siegfried e Brunilda na nova canção dos Nibelungos. A saber, que Siegfried parece já ter visto Brunilda uma vez antes. É claro agora que o que dá profundidade a esta prática é a sua ''conexão'' com a queima de uma pessoa.{{hidden|<sup>139</sup>}} Se fosse um costume de outro festival, em que os homens (como o jogo do cavaleiro e do corcel) cavalgam uns sobre os outros, então nada veríamos ali senão uma forma de transporte que lembra um homem andando a cavalo; — se, entretanto, soubéssemos que tinha sido o costume de muitos povos «↓ por exemplo» utilizar escravos como cavalgadura e assim celebrar certos festivais montados, então {{udashed|descobriríamos}} «{{udashed|veríamos}}» «{{udashed|encontraríamos}}» aqui agora, na prática inofensiva do nosso tempo, algo mais profundo e menos inofensivo. A pergunta é: esta coisa – digamos – tenebrosa se fixa à prática (em si) das fogueiras de Beltane, tal como ela foi executada há 100 anos, ou só quando a hipótese da sua origem fosse confirmada? Eu creio que isto é revelador da {{udashed|natureza}} interna {{MS reference|(MS 143, p. 11)}} da própria prática «moderna», que nos parece tenebroso, e de que para nós fatos conhecidos de sacrifícios humanos indicam apenas a direção em que devemos ver tal prática.{{hidden|<sup>140</sup>}} Quando falo da {{udashed|natureza}} interna da prática, me refiro a todas as circunstâncias pelas quais ela é executada e que não estão compreendidas no relato desse festival, pois elas não consistem tanto em determinadas ações que a caracterizam, quanto nas que se podem denominar como o espírito do festival,{{hidden|<sup>141</sup>}} que seria descrito quando se descreve, por exemplo, o tipo de gente que dele participa, seus outros tipos de ação, isto é, seu caráter; o tipo dos jogos que eles costumam jogar. Então se veria que o tenebroso está no próprio caráter desses homens.{{hidden|<sup>142</sup>}} {{MS reference|(MS 143, p. 12)}} | ||
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Aqui, algo parece com os restos de um sorteio. E por esse aspecto, de repente, isso ganha profundidade.{{hidden|<sup>144</sup>}} Se percebêssemos que o bolo teve de ser assado «originalmente» com botões, possivelmente em honra do fabricante de botões «no seu aniversário», e que a prática tivesse sido conservada na região, então essa prática de fato perderia toda a "profundidade", a não ser que ela residisse em si em sua forma presente.{{hidden|<sup>145</sup>}} No entanto, freqüentemente se diz num caso como esse: "essa prática é ''evidentemente'' muito antiga". De onde se sabe disso? Só porque se tem testemunho histórico sobre esse tipo de práticas antigas? Ou tem ainda um outro fundamento, um que se adquire por interpretação? Contudo, mesmo quando é historicamente provada a origem pré-histórica da prática e a sua filiação a uma prática tenebrosa, ainda assim é possível que hoje a prática ''nada mais'' tenha em si de tenebrosa, que nada do antigo horror fique nela retida. Talvez hoje ela só seja praticada por crianças que competem em assar bolos e ornamentá-los com botões. {{MS reference|(MS 143, p. 13)}} | Aqui, algo parece com os restos de um sorteio. E por esse aspecto, de repente, isso ganha profundidade.{{hidden|<sup>144</sup>}} Se percebêssemos que o bolo teve de ser assado «originalmente» com botões, possivelmente em honra do fabricante de botões «no seu aniversário», e que a prática tivesse sido conservada na região, então essa prática de fato perderia toda a "profundidade", a não ser que ela residisse em si em sua forma presente.{{hidden|<sup>145</sup>}} No entanto, freqüentemente se diz num caso como esse: "essa prática é ''evidentemente'' muito antiga". De onde se sabe disso? Só porque se tem testemunho histórico sobre esse tipo de práticas antigas? Ou tem ainda um outro fundamento, um que se adquire por interpretação? Contudo, mesmo quando é historicamente provada a origem pré-histórica da prática e a sua filiação a uma prática tenebrosa, ainda assim é possível que hoje a prática ''nada mais'' tenha em si de tenebrosa, que nada do antigo horror fique nela retida. Talvez hoje ela só seja praticada por crianças que competem em assar bolos e ornamentá-los com botões. {{MS reference|(MS 143, p. 13)}} | ||
Por isso, então, a profundidade está somente no pensamento de uma filiação. Entretanto, esta pode ser totalmente incerta, e poder-se-ia dizer: "para que tomar cuidados «ocupar-se» com uma coisa tão incerta" (como uma Elsa esperta{{hidden|<sup>146</sup>}} que olha para trás)? Mas não se trata de tais preocupações. – Sobretudo: de onde vem a segurança de que uma tal prática tem que ser muito antiga (quais são os nossos dados, qual é a verificação)? Entretanto nós temos uma segurança, não poderíamos estar equivocados e ter sido convencidos | Por isso, então, a profundidade está somente no pensamento de uma filiação. Entretanto, esta pode ser totalmente incerta, e poder-se-ia dizer: "para que tomar cuidados «ocupar-se» com uma coisa tão incerta" (como uma Elsa esperta{{hidden|<sup>146</sup>}} que olha para trás)? Mas não se trata de tais preocupações. – Sobretudo: de onde vem a segurança de que uma tal prática tem que ser muito antiga (quais são os nossos dados, qual é a verificação)? Entretanto nós temos uma segurança, não poderíamos estar equivocados e ter sido convencidos «↓ historicamente» de um equívoco? Certamente, mas então permanece sempre, claro, alguma coisa da qual estamos seguros. Poderíamos, «↓ portanto», dizer: "Bem, nesse caso a procedência poderia ser outra, mas em geral ela é certamente a pré- histórica". Aquilo que para nós é uma ''evidência'' disto, tem que conter a profundidade dessa suposição. E essa evidência é novamente psicológica «↓ e não-hipotética».{{hidden|<sup>147</sup>}} Se eu digo, por exemplo: a profundidade nessa prática está na sua procedência, ''se'' ela aconteceu assim. Então, a profundidade <s>deve</s> está no pensamento de uma tal procedência, ou a profundidade é «↓ ela mesma» apenas hipotética e só se pode dizer: ''se'' isso aconteceu assim, {{MS reference|(MS 143, p. 14)}} então foi uma história profunda e tenebrosa. Quero dizer: o tenebroso, o profundo, não reside no fato de ela ter ocorrido dessa forma, pois talvez ela não tenha ocorrido assim; nem tampouco que ela talvez ou realmente tenha sido assim, senão naquilo que me dá fundamento para isso supor tal suposição.{{hidden|<sup>148</sup>}} Claro, de onde vem na realidade o profundo e o tenebroso no sacrifício humano? São pois só os sofrimentos da vítima que nos impressionam? Doenças de todo tipo, que são ligadas a sofrimentos do mesmo tipo, não provocam ''contudo'' essa impressão. Não, esse profundo e tenebroso não são evidentes se nós só ficamos conhecendo a história da ação manifestada, pelo contrário ''nós'' o reintroduzimos a partir de uma experiência da nossa interioridade.{{hidden|<sup>149</sup>}} | ||
O fato de que a sorte seja tirada de um bolo tem (também) algo de particularmente espantoso (próximo de uma traição por um beijo), e que isso nos cause a impressão de ser particularmente {{udashed|espantoso}}, tem novamente um significado essencial para a investigação dessas {{MS reference|(MS 143, p. 15)}} práticas {de uma tal prática}.{{hidden|<sup>150</sup>}} | O fato de que a sorte seja tirada de um bolo tem (também) algo de particularmente espantoso (próximo de uma traição por um beijo), e que isso nos cause a impressão de ser particularmente {{udashed|espantoso}}, tem novamente um significado essencial para a investigação dessas {{MS reference|(MS 143, p. 15)}} práticas {de uma tal prática}.{{hidden|<sup>150</sup>}} | ||
Quando vejo essa prática, ouço sobre ela, é como ver um homem que, por um «ensejo» motivo insignificante, fala severamente com outro, e notar, pelo tom | Quando vejo essa prática, ouço sobre ela, é como ver um homem que, por um «ensejo» motivo insignificante, fala severamente com outro, e notar, pelo tom «↓ de voz» e pelo rosto, que esse homem, em dada ocasião, pode ser horrível. A impressão que obtenho aqui pode ser de um tipo mais profundo e extraordinariamente sério. | ||
O ''entorno'' de uma maneira de agir.{{hidden|<sup>151</sup>}} | O ''entorno'' de uma maneira de agir.{{hidden|<sup>151</sup>}} | ||
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Assim como o Festival de Beltane chegou até nós, ele seria um espetáculo e se assemelharia a quando as crianças brincam de ladrão. Mas não é assim. Pois mesmo estando combinado que a equipe que consegue salvar a vítima ganha, ainda assim o que ocorre tem sempre um acréscimo de vivacidade que a mera apresentação dramática não tem. – Porém mesmo quando se trata apenas de uma apresentação totalmente fria, nos perguntamos com inquietação: o que quer dizer esta apresentação, qual é o seu ''sentido''?! E ela poderia, independentemente de qualquer interpretação, nos inquietar pela sua própria falta de sentido. (O que mostra que tipo de fundamento pode ter uma tal inquietação).{{hidden|<sup>157</sup>}} Suponhamos talvez agora uma interpretação inócua: o {{MS reference|(MS 143, p. 18)}} sorteio é simplesmente feito, e com isso haveria divertimento em alguém poder ser ameaçado de ser jogado no fogo, algo que não seria agradável; assim, o Festival de Beltane seria muito semelhante a quaisquer diversões em que certas atrocidades da sociedade têm que ser toleradas e, tais como são, satisfazem uma necessidade. Com uma explicação como essa, o Festival de Beltane perderia realmente todo o mistério, se ele mesmo não se afastasse tanto da ação quanto da atmosfera de familiaridade de brincadeiras como as de ladrão etc.{{hidden|<sup>158</sup>}} | Assim como o Festival de Beltane chegou até nós, ele seria um espetáculo e se assemelharia a quando as crianças brincam de ladrão. Mas não é assim. Pois mesmo estando combinado que a equipe que consegue salvar a vítima ganha, ainda assim o que ocorre tem sempre um acréscimo de vivacidade que a mera apresentação dramática não tem. – Porém mesmo quando se trata apenas de uma apresentação totalmente fria, nos perguntamos com inquietação: o que quer dizer esta apresentação, qual é o seu ''sentido''?! E ela poderia, independentemente de qualquer interpretação, nos inquietar pela sua própria falta de sentido. (O que mostra que tipo de fundamento pode ter uma tal inquietação).{{hidden|<sup>157</sup>}} Suponhamos talvez agora uma interpretação inócua: o {{MS reference|(MS 143, p. 18)}} sorteio é simplesmente feito, e com isso haveria divertimento em alguém poder ser ameaçado de ser jogado no fogo, algo que não seria agradável; assim, o Festival de Beltane seria muito semelhante a quaisquer diversões em que certas atrocidades da sociedade têm que ser toleradas e, tais como são, satisfazem uma necessidade. Com uma explicação como essa, o Festival de Beltane perderia realmente todo o mistério, se ele mesmo não se afastasse tanto da ação quanto da atmosfera de familiaridade de brincadeiras como as de ladrão etc.{{hidden|<sup>158</sup>}} | ||
Tal como se as crianças em certos dias queimassem um espantalho, não havendo para isso nenhuma explicação, o que nos deixaria intranqüilos. Estranho que ''uma pessoa'' deva ser queimada festivamente | Tal como se as crianças em certos dias queimassem um espantalho, não havendo para isso nenhuma explicação, o que nos deixaria intranqüilos. Estranho que ''uma pessoa'' deva ser queimada festivamente «↓ pelos seus»! Quero dizer: a solução não é mais inquietante que o enigma.{{hidden|<sup>159</sup>}} | ||
Por que não deve ser realmente só o ''pensamento'' (ou ao menos parcialmente) que me impressiona? Não são as representações, com efeito, temíveis? Eu poderia pretender que não fosse horripilante o pensamento de que o bolo com botões foi servido para sortear a morte da vítima? Não tem o ''pensamento'' {{MS reference|(MS 143, p. 19)}} algo de temível? – Sim, mas o que vejo nesses relatos é obtido, claro, pela evidência, mas também por aquela que não parece estar imediatamente ligada a eles: pelo pensamento sobre o homem e seu passado, por toda a estranheza{{hidden|<sup>160</sup>}} que vejo, vi e ouvi em mim e no outro.{{hidden|<sup>161</sup>}} {{MS reference|(MS 143, p. 20)}} | Por que não deve ser realmente só o ''pensamento'' (ou ao menos parcialmente) que me impressiona? Não são as representações, com efeito, temíveis? Eu poderia pretender que não fosse horripilante o pensamento de que o bolo com botões foi servido para sortear a morte da vítima? Não tem o ''pensamento'' {{MS reference|(MS 143, p. 19)}} algo de temível? – Sim, mas o que vejo nesses relatos é obtido, claro, pela evidência, mas também por aquela que não parece estar imediatamente ligada a eles: pelo pensamento sobre o homem e seu passado, por toda a estranheza{{hidden|<sup>160</sup>}} que vejo, vi e ouvi em mim e no outro.{{hidden|<sup>161</sup>}} {{MS reference|(MS 143, p. 20)}} |