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'''3.143''' Que um signo proposicional seja um fato, isto é velado pela forma comum de expressão, escrita ou impressa.
'''3.143''' Que um signo proposicional seja um fato, isto é velado pela forma comum de expressão, escrita ou impressa.
Na proposição impressa, por exemplo, o signo proposicional não parece essencialmente diferente da palavra.
(Foi assim possível a Frege chamar à proposição de nome composto.)
'''3.1431''' A essência do signo proposicional se torna muito clara quando, em vez de o pensarmos composto de signos escritos, o pensamos composto de objetos espaciais (tais como mesas, cadeiras, livros).
A posição espacial oposta dessas coisas exprime, pois, o sentido da proposição.
'''3.1432''' Não: "O signo complexo '''aRb''<nowiki/>' diz que ''a'' por ''R'' se relaciona com ''b''", mas: que "''a''" por um certo ''R'' se relaciona com "''b''", isto quer dizer ''que'' ''aRb''.
'''3.144''' É possível descrever situações, impossível no entanto ''nomeá-las''.
(Os nomes são como pontos, as proposições, flechas; possuem sentido.)
'''3.2''' Nas proposições os pensamentos podem ser expressos de tal modo que aos objetos dos pensamentos correspondam elementos do signo proposicional.
'''3.201''' A êsses elementos chamo de "signos simples" e à proposição, "completamente analisada".
'''3.202''' Os signos simples empregados nas proposições são chamados nomes.
'''3.203''' O nome denota o objeto. O objeto é sua denotação. ("''A''" é o mesmo signo que "''A''".)
'''3.21''' À configuração dos signos simples no signo proposicional corresponde a configuração dos objetos na situação.
'''3.22''' Na proposição o nome substitui o objeto.
'''3.221''' Posso ''nomear'' apenas objetos. Os signos os substituem. Posso apenas falar ''sobre'' êles, não posso, porém, ''enunciá-los''. Uma proposição pode apenas dizer ''como'' uma coisa é, mas não ''o que'' é.
'''3.23''' Postular a possibilidade de signos simples é postular a determinabilidade do sentido.
'''3.24''' A proposição que trata de um complexo achase numa relação interna com a proposição que trata das partes constituintes dêle.
O complexo só pode ser dado por sua descrição, e esta concordará ou não concordará com êle. A proposição que se ocupa de um complexo inexistente não será absurda, mas simplesmente falsa.
Que um elemento proposicional designa um complexo, isto pode ser visto graças a uma indeterminabilidade na proposição na qual êle aparece. ''Sabemos'' por esta proposição que nem tudo está determinado. (A designação da universalidade já ''contém'', com efeito, uma protofiguração.)
A reunião dos símbolos de um complexo em um símbolo simples pode ser expressa por uma definição.
'''3.25''' Existe apenas uma e uma única análise completa da proposição.
'''3.251''' A proposição exprime o que é expresso de um modo determinado e dado claramente: A proposição é articulada.
'''3.26''' O nome não é para ser desmembrado ademais por uma definição: é um signo primitivo.
'''3.261''' Cada signo definido designa ''por sôbre'' os signos pelos quais é definido, e as definições mostram o caminho.
Dois signos, um signo primitivo e outro definido por signos primitivos, não podem designar pela mesma maneira. Nomes ''não podem'' ser decompostos por definições. (Nenhum signo isolado e autônomo possui denotação.)
'''3.262''' O que no signo não vem expresso é indicado pela aplicação. O que os signos escondem, a aplicação exprime.
'''3.263''' As denotações dos signos primitivos podem ser esclarecidas por elucidações. Elucidações são proposições que contêm os signos primitivos. Só podem, portanto, ser entendidas quando já se conhecem as denotações dêsses signos.
'''3.3''' Só a proposição possui sentido; só em conexão com a proposição um nome tem denotação.
'''3.31''' A cada parte da proposição que caracteriza um sentido chamo de expressão (símbolo).
(A própria proposição é uma expressão.)
A expressão é tudo que, sendo essencial para o sentido da proposição, as proposições podem ter em comum entre si.
A expressão caracteriza uma forma e um conteúdo.
'''3.311''' A expressão pressupõe as formas de tôdas as proposições nas quais pode aparecer. Constitui a marca característica comum a uma classe de proposições.
'''3.312''' Representa-se, pois, por intermédio da forma geral das proposições que a caracteriza.
E assim a expressão será, nesta forma, ''constante'' e todo o resto, ''variável''.
'''3.313''' A expressão será representada por uma variável, cujos valores são as proposições que contêm a expressão.
(No caso limite, a variável torna-se constante, a expressão, a proposição.)
A uma tal variável chamo de "variável proposicional".
'''3.314''' A expressão tem denotação apenas na proposição. Cada variável pode ser concebida como variável proposicional.
(A variável nome também.)
'''3.315''' Se transformarmos uma parte constituinte de uma proposição numa variável, existe então uma classe de proposições constituída por todos os valores da proposição variável assim resultante. Esta classe ainda depende em geral do que nós, segundo um ajuste arbitrário, chamamos partes da proposição. Se, no entanto, transformarmos todos aquêles signos, cujas denotações foram determinadas arbitra riamente, em variáveis, ainda continua a existir aquela classe. Esta, porém, não mais depende de qualquer ajuste, mas únicamente da natureza da proposição. Corresponde a uma forma lógica — a uma protofiguração lógica.
'''3.316''' Fixam-se os valores que a variável proposicional deve tomar.
A fixação dos valôres ''é'' a variável.
'''3.317''' A fixação dos valores das variáveis proposicionais consiste na ''indicação das proposições'', as quais têm como marca característica comum a variável.
A fixação é uma descrição dessas proposições.
A fixação se ocupará, pois, únicamente dos símbolos, não se ocupando de sua denotação.
E para a fixação é essencial ''ser apenas uma descrição de símbolos, nada assertando sobre o designado''. Como se dá a descrição da proposição é inessencial.
'''3.318''' Concebo a proposição — do mesmo modo que Frege e Russell — como função das expressões que nela estão contidas.
'''3.32''' O signo é o que no símbolo é sensivelmente perceptível.
'''3.321''' Dois símbolos diferentes podem ter, pois, em comum o mesmo signo (escrito ou sonoro, etc.) — designam dêsse modo de diferentes maneiras.
'''3.322''' A marca característica comum a dois objetos nunca pode indicar que os designamos com o mesmo signo, embora com diferentes ''modos de designação''; porquanto o signo, sem dúvida, é arbitrário. Poderíamos, portanto, escolher dois signos diferentes, e onde permaneceria o que é comum na designação?
'''3.323''' Na linguagem corrente amiúde acontece que a mesma palavra designa de modos diferentes — pertencendo, pois, a símbolos diferentes — ou ainda duas palavras, que designam de modos diferentes, são empregadas na proposição superficialmente da mesma maneira.

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A memória de

David H. Pinsent

Mote: ... e tudo o que se sabe, que não seja apenas rumor ouvido, pode ser dito em três palavras.

Kürnberger


Prefácio

Talvez êste livro sòmente seja compreendido por quem já tenha cogitado por si próprio os pensamentos aqui expressos, ou ao menos cogitado pensamentos semelhantes. Não é, pois, um manual. Terá alcançado seu objetivo se agradar a quem o ler com atenção.

Trata de problemas filosóficos e mostra, creio eu, que o questionar dêsses problemas repousa na má compreensão da lógica de nossa linguagem. Poder-se-ia apanhar todo o sentido do livro com estas palavras: em geral o que pode ser dito, o pode ser claramente, mas o que não se pode falar deve-se calar.

Pretende, portanto, estabelecer um limite ao pensar, ou melhor, não ao pensar mas à expressão do pensamento, porquanto para traçar um limite ao pensar deveríamos poder pensar ambos os lados dêsse limite (de sorte que deveríamos pensar o que não pode ser pensado).

O limite será, pois, traçado únicamente no interior da lingua; tudo o que fica além dêle será simplesmente absurdo.

Não quero julgar até onde meus esforços coincidem com os de outros filósofos. Por certo o que escrevi não pretende ser original no pormenor; por isso não dou fonte alguma, pôsto que me é indiferente se o que pensei já foi pensado por alguém antes de mim.

Quero apenas mencionar que devo grande parte do estímulo a meus pensamentos às grandiosas obras de Frege e aos trabalhos de meu amigo Sr. Bertrand Russell.

Caso meu trabalho tenha valor, êle será duplo. Primeiramente porque exprime pensamentos, valor que será tanto maior quanto melhor os pensamentos forem expressos. Nisto estou consciente de estar muito aquém do possível, simplesmente porque minhas forças são poucas para cumprir a tarefa. Possam outros vir e fazer melhor.

No entanto, a verdade dos pensamentos comunicados aqui me parece intocável e definitiva, de modo que penso ter resolvido os problemas no que é essencial. Se não me engano, o segundo valor dêsse trabalho é mostrar quão pouco se consegue quando se resolvem tais problemas.

Viena, 1918

L. W.


1[1] O mundo é tudo o que ocorre.

1.1 O mundo é a totalidade dos fatos, não das coisas.

1.11 O mundo é determinado pelos fatos e por isto consistir em todos os fatos.

1.12 A totalidade dos fatos determina, pois, o que ocorre e também tudo que não ocorre.

1.13 Os fatos, no espaço lógico, são o mundo. O mundo se resolve em fatos...

1.2 Algo pode ocorrer ou não ocorrer e todo o resto permanecer na mesma.

2 O que ocorre, o fato, é o subsistir dos estados de coisas.

2.01 O estado de coisas é uma ligação de objetos (coisas).

2.011 É essencial para a coisa poder ser parte consti- tuinte de um estado de coisas.

2.012 Nada é acidental na lógica: se uma coisa puder aparecer num estado de coisas, a possibilidade do estado de coisas já deve estar antecipada nela.

2.0121 Parece, por assim dizer, acidental que à coisa, que poderia subsistir sozinha e para si, viesse ajus- tar-se em seguida uma situação..

Se as coisas podem aparecer em estados de coisas, então isto já deve estar nelas.

(Algo lógico não pode ser meramente-possível. A lógica trata de cada possibilidade e todas as possibilidades são fatos que lhe pertencem.)

Assim como não podemos pensar objetos espaciais fora do espaço, os temporais fora do tempo, assim não podemos pensar nenhum objeto fora da possibilidade de sua ligação com outros.

Se posso pensar o objeto ligando-o ao estado de coisas, não posso então pensá-lo fora da possibilidade dessa ligação.

2.0122 A coisa é autônoma enquanto puder aparecer em tôdas as situações possíveis, mas esta forma de autonomia é uma forma de conexão com o estado de coisas, uma forma de heteronomia. (É impossível palavras comparecerem de dois modos diferentes, sòzinhas e na proposição.)

2.0123 Se conheço o objeto, também conheço tôdas as. possibilidades de seu aparecer em estados de coisas.

(Cada uma dessas possibilidades deve estar na natureza do objeto.)

Não é possível posteriormente encontrar nova possibilidade.

2.01231 Para conhecer um objeto não devo com efeito conhecer suas propriedades externas — mas todas as internas.

2.0124 Ao serem dados todos os objetos, dão-se também todos os possíveis estados de coisas.

2.013 Cada coisa está como num espaço de estados de coisas possíveis. Posso pensar êste espaço vazio, mas não a coisa sem o espaço.

2.0131 O objeto espacial deve estar no espaço infinito. (O ponto no espaço é lugar do argumento.)

A mancha no campo visual não deve, pois, ser vermelha, mas deve ter uma côr; tem; por assim dizer, uma espacialidade colorida em volta de si. O som deve possuir uma altura, o objeto do tato, uma dureza, e assim por diante.

2.014 Os objetos contêm a possibilidade de todas as situações.

2.0141 A possibilidade de seu aparecer nos estados de coisas é a forma dos objetos.

2.02 O objeto é simples.

2.0201 Cada asserção sobre complexos deixa-se dividir numa asserção sobre suas partes constitutivas e naquelas proposições que descrevem inteiramente tais complexos.

2.021 Os objetos formam a substância do mundo. Por isso não podem ser compostos.

2.0211 Se o mundo não possuísse substância, para uma proposição ter sentido dependeria de outra proposição ser verdadeira.

2.0212 Seria, pois, impossível traçar uma figuração do mundo (verdadeira ou falsa).

2.022 É claro que um mundo, pensado muito diferente do real, deve possuir algo — uma forma — comum com êste mundo real.

2.023 Esta forma fixa consiste precisamente em objetos.

2.0231 A substância do mundo pode determinar apenas uma forma, mas não propriedades materiais; já que estas são primeiramente representadas pelas proposições — primeiramente formadas pela configuração dos objetos.

2.0232 Aproximadamente falando: os objetos são desprovidos de côr.

2.0233 Dois objetos de mesma forma lógica — abstraindo suas propriedades externas — se diferenciam um do outro apenas por serem distintos.

2.02331 Ou uma coisa possui propriedades que nenhuma outra possui e dêsse modo é possível sem mais separá- la de outras por uma descrição e referir-se a ela; ou, ao contrário, existem várias coisas que possuem tôdas suas propriedades em comum, sendo então impossível em geral indicar uma delas.

Se a coisa não se distingue por nada, não posso então distingui-la, pois do contrário estaria distinguida.

2.024 Substância é o que subsiste independentemente do que ocorre.

2.025 Ela é forma e conteúdo.

2.0251 Espaço, tempo e côr (coloridade) são formas dos objetos.

2.026 Só se houver objetos, pode haver forma fixa do mundo.

2.027 O fixo, o subsistente e o objeto são um só.

2.0271 O objeto é o fixo, o subsistente; a configuração é o mutável, o instável.

2.0272 A configuração dos objetos forma o estado de coisas.

2.03 No estado de coisas os objetos se ligam uns aos outros como elos de uma cadeia.

2.031 No estado de coisas os objetos estão uns em relação aos outros de um modo determinado.

2.032 O modo pelo qual os objetos se vinculam no estado de coisas constitui a estrutura do estado de coisas.

2.033 A forma é a possibilidade da estrutura.

2.034 A estrutura do fato é constituída pelas estruturas dos estados de coisas.

2.04 A totalidade dos subsistentes estados de coisas é o mundo.

2.05 A totalidade dos subsistentes estados de coisas determina também quais estados de coisas não subsistem.

2.06 A subsistência e a não-subsistência dos estados de coisas é a realidade.

(Chamamos de fato positivo à subsistência de estados de coisas e de negativo à não-subsistência dėles.)

2.061 Os estados de coisas são independentes uns dos outros.

2.062 Da subsistência ou da não-subsistência de um estado de coisas não é possível concluir a subsistência ou a não-subsistência de outro.

2.063 A realidade inteira é o mundo.

2.1 Fazemo-nos figurações dos fatos.

2.11 A figuração presenta a situação no espaço lógico, a subsistência e a não-subsistência de estados de coisas.

2.12 A figuração é um modelo da realidade.

2.13 Na figuração, seus elementos correspondem aos objetos.

2.131 Os elementos da figuração substituem nela os objetos.

2.14 A figuração consiste em que seus elementos estão uns em relação aos outros de um modo determinado.

2.141 A figuração é um fato.

2.15 Os elementos da figuração estando uns em relação aos outros de um modo determinado, isto representa as coisas estando umas em relação às outras.

Esta vinculação dos elementos da figuração chama-se sua estrutura e a possibilidade dela, sua forma de afiguração.

2.151 A forma de afiguração é a possibilidade de que as coisas estejam umas em relação às outras como os elementos da figuração.

2.1511 A figuração enlaça-se com a realidade; dêste modo: estendendo-se para ela.

2.1512 É como padrão de medida que se aplica à realidade.

2.15121 Somente os pontos mais exteriores das linhas divisórias tocam o objeto a ser medido.

2.1513 Segundo essa concepção, também pertence à figuração a forma afigurante que precisamente a torna figuração.

2.1515 A relação afigurante consiste nas coordenações dos elementos da figuração e das coisas.

2.1515 Estas coordenações são, por assim dizer, antenas dos elementos da figuração, com as quais esta toca a realidade.

2.16 Os fatos, para serem figuração, devem ter algo em comum com o que é afigurado.

2.161 Deve haver algo idêntico na figuração e no afigurado a fim de que um possa ser a figuração do

outro.

2.17 O que a figuração realidade para poder correta ou falsamente deve ter em comum com a afigurar à sua maneira é sua forma de afiguração.

2.171 A figuração pode afigurar qualquer realidade cuja forma ela possui.

A figuração espacial, tudo o que é espacial; a colorida, tudo que é colorido, etc.

2.172 Sua forma de afiguração, contudo, a figuração não pode afigurar; apenas a exibe.

2.173 A figuração representa seu objeto de fora (seu ponto de vista é sua forma de representação), por isso a figuração representa seu objeto correta ou falsamente.

2.174 A figuração não pode, porém, colocar-se fora de sua forma de representação.

2.18 O que cada figuração, de forma qualquer, deve sempre ter em comum com a realidade para poder afigurá-la em geral - correta ou falsamente - é a forma lógica, isto é, a forma da realidade.

2.181 Se a forma da afiguração é a forma lógica, a figuração chama-se lógica.

2.182 Tôda figuração também é lógica. (No entanto, nem tôda figuração é, por exemplo, espacial.)

2.19 A figuração lógica pode afigurar o mundo.

2.2 A figuração tem em comum com o afigurado a forma lógica da afiguração.

2.201 A figuração afigura a realidade, pois representa uma possibilidade da subsistência e da não-subsistência de estados de coisas.

2.202 A figuração representa uma situação possível no espaço lógico.

2.203 A figuração contém a possibilidade da situação, a qual ela representa.

2.21 A figuração concorda ou não com a realidade, é correta ou incorreta, verdadeira ou falsa.

2.22 A figuração representa o que representa, independentemente de sua verdade ou falsidade, por meio da forma da afiguração.

2.221 O que a figuração representa é o seu sentido.

2.222 Na concordância ou na discordância de seu sentido com a realidade consiste sua verdade ou sua falsidade.

2.223 Para reconhecer se uma figuração é verdadeira ou falsa devemos compará-la com a realidade.

2.224 Não é possível reconhecer apenas pela figuração se ela é verdadeira ou falsa.

2.225 Não existe uma figuração a priori verdadeira.

3 Pensamento é a figuração lógica dos fatos.

3.001 "Um estado de coisas é pensável" significa: podemos construir-nos uma figuração dêle.

3.01 A totalidade dos pensamentos verdadeiros figuração do mundo.

3.02 O pensamento contém a possibilidade da situação que êle pensa. O que é pensável também é possível.

3.03 Não podemos pensar nada ilógico, porquanto, do contrário, deveríamos pensar ilògicamente.

3.031 Já foi dito por alguém que Deus poderia criar tudo, salvo o que contrariasse as leis lógicas. Isto porque não podemos dizer como pareceria um mundo "ilógico".

3.032 Representar na linguagem algo que "contrarie as leis lógicas" é tão pouco possível como representar, na geometria, por meio de suas coordenadas, uma figura que contrarie as leis do espaço; ou, então, dar as coordenadas de um ponto inexistente.

3.0321 Podemos perfeitamente representar um estado de coisas espacial contrário às leis da física, nunca, porém, contrário às leis da geometria.

3.04 Um pensamento correto a priori seria aquêle cuja possibilidade condicionasse sua verdade.

3.05 Desse modo, só poderíamos conhecer a priori que um pensamento é verdadeiro se a verdade dêle fosse reconhecível a partir do próprio pensamento (sem objeto de comparação).

3.1 Na proposição o pensamento se exprime sensível e perceptivelmente.

3.11 Utilizamos o signo sensível e perceptível (signo sonoro ou escrito, etc.) da proposição como projeção da situação possível.

O método de projeção é o pensar do sentido da proposição.

3.12 Chamo signo proposicional o signo pelo qual exprimimos o pensamento. E a proposição é o signo proposicional em sua relação projetiva com o mundo.

3.13 A proposição pertence tudo que pertence à projeção, não, porém, o que é projetado.

Portanto, a possibilidade do que é projetado, não, porém, êste último.

A proposição, portanto, não contém seu sentido, mas a possibilidade de exprimi-lo.

("O conteúdo da proposição" quer dizer o conteúdo da proposição significativa.)

Está contida na proposição a forma de seu sentido, não, porém, seu conteúdo.

3.14 O signo proposicional consiste em que seus elementos, as palavras, estão relacionados uns aos outros de maneira determinada.

O signo proposicional é um fato.

3.141 A proposição não é uma mistura de palavras. (Do mesmo modo que o tema musical não é uma mistura de sons.)

A proposição é articulada.

3.142 Sòmente fatos podem exprimir um sentido, uma classe de nomes não o pode.

3.143 Que um signo proposicional seja um fato, isto é velado pela forma comum de expressão, escrita ou impressa.

Na proposição impressa, por exemplo, o signo proposicional não parece essencialmente diferente da palavra.

(Foi assim possível a Frege chamar à proposição de nome composto.)

3.1431 A essência do signo proposicional se torna muito clara quando, em vez de o pensarmos composto de signos escritos, o pensamos composto de objetos espaciais (tais como mesas, cadeiras, livros).

A posição espacial oposta dessas coisas exprime, pois, o sentido da proposição.

'3.1432 Não: "O signo complexo aRb' diz que a por R se relaciona com b", mas: que "a" por um certo R se relaciona com "b", isto quer dizer que aRb.

3.144 É possível descrever situações, impossível no entanto nomeá-las.

(Os nomes são como pontos, as proposições, flechas; possuem sentido.)

3.2 Nas proposições os pensamentos podem ser expressos de tal modo que aos objetos dos pensamentos correspondam elementos do signo proposicional.

3.201 A êsses elementos chamo de "signos simples" e à proposição, "completamente analisada".

3.202 Os signos simples empregados nas proposições são chamados nomes.

3.203 O nome denota o objeto. O objeto é sua denotação. ("A" é o mesmo signo que "A".)

3.21 À configuração dos signos simples no signo proposicional corresponde a configuração dos objetos na situação.

3.22 Na proposição o nome substitui o objeto.

3.221 Posso nomear apenas objetos. Os signos os substituem. Posso apenas falar sobre êles, não posso, porém, enunciá-los. Uma proposição pode apenas dizer como uma coisa é, mas não o que é.

3.23 Postular a possibilidade de signos simples é postular a determinabilidade do sentido.

3.24 A proposição que trata de um complexo achase numa relação interna com a proposição que trata das partes constituintes dêle.

O complexo só pode ser dado por sua descrição, e esta concordará ou não concordará com êle. A proposição que se ocupa de um complexo inexistente não será absurda, mas simplesmente falsa.

Que um elemento proposicional designa um complexo, isto pode ser visto graças a uma indeterminabilidade na proposição na qual êle aparece. Sabemos por esta proposição que nem tudo está determinado. (A designação da universalidade já contém, com efeito, uma protofiguração.)

A reunião dos símbolos de um complexo em um símbolo simples pode ser expressa por uma definição.

3.25 Existe apenas uma e uma única análise completa da proposição.

3.251 A proposição exprime o que é expresso de um modo determinado e dado claramente: A proposição é articulada.

3.26 O nome não é para ser desmembrado ademais por uma definição: é um signo primitivo.

3.261 Cada signo definido designa por sôbre os signos pelos quais é definido, e as definições mostram o caminho.

Dois signos, um signo primitivo e outro definido por signos primitivos, não podem designar pela mesma maneira. Nomes não podem ser decompostos por definições. (Nenhum signo isolado e autônomo possui denotação.)

3.262 O que no signo não vem expresso é indicado pela aplicação. O que os signos escondem, a aplicação exprime.

3.263 As denotações dos signos primitivos podem ser esclarecidas por elucidações. Elucidações são proposições que contêm os signos primitivos. Só podem, portanto, ser entendidas quando já se conhecem as denotações dêsses signos.

3.3 Só a proposição possui sentido; só em conexão com a proposição um nome tem denotação.

3.31 A cada parte da proposição que caracteriza um sentido chamo de expressão (símbolo).

(A própria proposição é uma expressão.)

A expressão é tudo que, sendo essencial para o sentido da proposição, as proposições podem ter em comum entre si.

A expressão caracteriza uma forma e um conteúdo.

3.311 A expressão pressupõe as formas de tôdas as proposições nas quais pode aparecer. Constitui a marca característica comum a uma classe de proposições.

3.312 Representa-se, pois, por intermédio da forma geral das proposições que a caracteriza.

E assim a expressão será, nesta forma, constante e todo o resto, variável.

3.313 A expressão será representada por uma variável, cujos valores são as proposições que contêm a expressão.

(No caso limite, a variável torna-se constante, a expressão, a proposição.)

A uma tal variável chamo de "variável proposicional".

3.314 A expressão tem denotação apenas na proposição. Cada variável pode ser concebida como variável proposicional.

(A variável nome também.)

3.315 Se transformarmos uma parte constituinte de uma proposição numa variável, existe então uma classe de proposições constituída por todos os valores da proposição variável assim resultante. Esta classe ainda depende em geral do que nós, segundo um ajuste arbitrário, chamamos partes da proposição. Se, no entanto, transformarmos todos aquêles signos, cujas denotações foram determinadas arbitra riamente, em variáveis, ainda continua a existir aquela classe. Esta, porém, não mais depende de qualquer ajuste, mas únicamente da natureza da proposição. Corresponde a uma forma lógica — a uma protofiguração lógica.

3.316 Fixam-se os valores que a variável proposicional deve tomar.

A fixação dos valôres é a variável.

3.317 A fixação dos valores das variáveis proposicionais consiste na indicação das proposições, as quais têm como marca característica comum a variável.

A fixação é uma descrição dessas proposições.

A fixação se ocupará, pois, únicamente dos símbolos, não se ocupando de sua denotação.

E para a fixação é essencial ser apenas uma descrição de símbolos, nada assertando sobre o designado. Como se dá a descrição da proposição é inessencial.

3.318 Concebo a proposição — do mesmo modo que Frege e Russell — como função das expressões que nela estão contidas.

3.32 O signo é o que no símbolo é sensivelmente perceptível.

3.321 Dois símbolos diferentes podem ter, pois, em comum o mesmo signo (escrito ou sonoro, etc.) — designam dêsse modo de diferentes maneiras.

3.322 A marca característica comum a dois objetos nunca pode indicar que os designamos com o mesmo signo, embora com diferentes modos de designação; porquanto o signo, sem dúvida, é arbitrário. Poderíamos, portanto, escolher dois signos diferentes, e onde permaneceria o que é comum na designação?

3.323 Na linguagem corrente amiúde acontece que a mesma palavra designa de modos diferentes — pertencendo, pois, a símbolos diferentes — ou ainda duas palavras, que designam de modos diferentes, são empregadas na proposição superficialmente da mesma maneira.

  1. Os algarismos que enumeram as proposições isoladas indicam o peso lógico dessas proposições, a importância que adquirem em minha exposição. As proposições n.1, n.2, n.3, etc., constituem observações à proposição n.° n; as proposições n.m1, n.m2, etc., observações à proposição n.° n.m, e assim por diante.