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A profundidade da magia teria que ser mantida. – Sim, pois a eliminação <s>de toda</s> da magia teria aqui o caráter da própria magia.{{hidden|<sup>20</sup>}} | A profundidade da magia teria que ser mantida. – Sim, pois a eliminação <s>de toda</s> da magia teria aqui o caráter da própria magia.{{hidden|<sup>20</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 110, p. 177)}} | |||
Pois, se eu comecei a falar do "mundo" (e não desta árvore ou mesa), o que teria querido senão encantar com as minhas palavras algo de mais alto?]{{hidden|<sup>21</sup>}} | Pois, se eu comecei a falar do "mundo" (e não desta árvore ou mesa), o que teria querido senão encantar com as minhas palavras algo de mais alto?]{{hidden|<sup>21</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 110, p. 178)}} | |||
Deve-se começar pelo erro e convertê-lo à verdade.{{hidden|<sup>22</sup>}} | Deve-se começar pelo erro e convertê-lo à verdade.{{hidden|<sup>22</sup>}} | ||
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Quando ele nos explica, por exemplo, que o rei tinha que ser morto no seu auge, | Quando ele nos explica, por exemplo, que o rei tinha que ser morto no seu auge, | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 313)}} | |||
porque caso contrário, segundo as concepções dos selvagens, a sua alma não se conservaria fresca,{{hidden|<sup>29</sup>}} então só se pode dizer: onde estes costumes e concepções andam juntos, então o costume não se origina da concepção, mas ambos já estão de fato ali.{{hidden|<sup>30</sup>}} | porque caso contrário, segundo as concepções dos selvagens, a sua alma não se conservaria fresca,{{hidden|<sup>29</sup>}} então só se pode dizer: onde estes costumes e concepções andam juntos, então o costume não se origina da concepção, mas ambos já estão de fato ali.{{hidden|<sup>30</sup>}} | ||
Line 53: | Line 53: | ||
E a explicação não é aqui de nenhum modo o que satisfaz. Quando Frazer começa a nos relatar a história do rei do bosque de Nemi, ele o faz num tom que mostra que ele sente, e nos quer fazer sentir, que aqui ocorre algo de estranho e temível. Mas a pergunta ―por que isso ocorre?‖ só pode ser respondida na verdade por: por que isso é temível. Isto é, o mesmo que se nos apresenta nesse acontecimento como temível, grandioso, horripilante, trágico etc., não menos que trivial e insignificante, ''isso'' gerou esse acontecimento{{hidden|<sup>35</sup>}} | E a explicação não é aqui de nenhum modo o que satisfaz. Quando Frazer começa a nos relatar a história do rei do bosque de Nemi, ele o faz num tom que mostra que ele sente, e nos quer fazer sentir, que aqui ocorre algo de estranho e temível. Mas a pergunta ―por que isso ocorre?‖ só pode ser respondida na verdade por: por que isso é temível. Isto é, o mesmo que se nos apresenta nesse acontecimento como temível, grandioso, horripilante, trágico etc., não menos que trivial e insignificante, ''isso'' gerou esse acontecimento{{hidden|<sup>35</sup>}} | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 314)}} | |||
Aqui só se pode ''descrever'' e dizer: assim é a vida humana. | Aqui só se pode ''descrever'' e dizer: assim é a vida humana. | ||
Line 79: | Line 79: | ||
Poder-se-ia dizer: este e este acontecimento se realizaram; ri, se podes.'''{{hidden|<sup>44</sup>}}''' | Poder-se-ia dizer: este e este acontecimento se realizaram; ri, se podes.'''{{hidden|<sup>44</sup>}}''' | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 315)}} | |||
A ação religiosa, ou a vida religiosa do rei-sacerdote não é de outro tipo que toda a ação religiosa autêntica de hoje, por exemplo de uma confissão de pecados. Também esta se pode ―''explicar''‖ e não se pode explicar.{{hidden|<sup>45</sup>}} | A ação religiosa, ou a vida religiosa do rei-sacerdote não é de outro tipo que toda a ação religiosa autêntica de hoje, por exemplo de uma confissão de pecados. Também esta se pode ―''explicar''‖ e não se pode explicar.{{hidden|<sup>45</sup>}} | ||
Line 97: | Line 97: | ||
A magia, claro, efetiva a apresentação de um desejo; ela exterioriza um desejo.{{hidden|<sup>53</sup>}} | A magia, claro, efetiva a apresentação de um desejo; ela exterioriza um desejo.{{hidden|<sup>53</sup>}} | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 316)}} | |||
O batismo como lavagem. – Um erro se produz, antes de tudo, | O batismo como lavagem. – Um erro se produz, antes de tudo, | ||
Line 120: | Line 120: | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 317)}} | |||
homem da tribo deva vê-lo. Este último poderia vir a ocorrer certamente não para qualquer um de modo mais ou menos casual, mas ele seria ''mostrado'' ao povo. Talvez não fosse permitido a ninguém tocar nele, | homem da tribo deva vê-lo. Este último poderia vir a ocorrer certamente não para qualquer um de modo mais ou menos casual, mas ele seria ''mostrado'' ao povo. Talvez não fosse permitido a ninguém tocar nele, | ||
Line 135: | Line 135: | ||
Que a sombra de uma pessoa, que vemos como uma pessoa, ou a sua imagem no espelho, que chuva, trovoada, as fases da lua, a mudança das estações, a semelhança e a diferença dos animais entre si e com as pessoas, as manifestações da morte, o nascimento e a vida sexual, | Que a sombra de uma pessoa, que vemos como uma pessoa, ou a sua imagem no espelho, que chuva, trovoada, as fases da lua, a mudança das estações, a semelhança e a diferença dos animais entre si e com as pessoas, as manifestações da morte, o nascimento e a vida sexual, | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 318)}} | |||
em suma, tudo que as pessoas todos os anos percebem ao redor de si, e ligam de múltiplas maneiras entre si, é compreensível que se apresentem | em suma, tudo que as pessoas todos os anos percebem ao redor de si, e ligam de múltiplas maneiras entre si, é compreensível que se apresentem | ||
Line 158: | Line 158: | ||
Isto é, poder-se-ia começar um livro sobre antropologia assim: quando se considera a vida e a conduta do homem sobre a terra, é possível ver que, além do que se pode denominar atividades animais, a alimentação etc., etc., etc., há também realizações que carregam um caráter | Isto é, poder-se-ia começar um livro sobre antropologia assim: quando se considera a vida e a conduta do homem sobre a terra, é possível ver que, além do que se pode denominar atividades animais, a alimentação etc., etc., etc., há também realizações que carregam um caráter | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 319)}} | |||
totalmente outro //específico// e que se poderiam denominar ações rituais.{{hidden|<sup>70</sup>}} | totalmente outro //específico// e que se poderiam denominar ações rituais.{{hidden|<sup>70</sup>}} | ||
Line 174: | Line 174: | ||
Frazer: ―... That these observances are dictated by fear of the ghost of the slain seems certain; ...‖ (―...Que essas observâncias sejam ditadas pelo medo do fantasma do assassinado, parece certo;...‖){{hidden|<sup>76</sup>}} Mas então por que usa Frazer a palavra ―ghost‖ (fantasma)? Ele compreende, portanto, muito bem esta superstição, já que ele nos explica o que ela é com uma palavra supersticiosa e familiar para ele. Ou antes, ele teria que poder ver que também fala em nós algo em favor do modo de agir dos selvagens. – Quando eu, que não creio que haja em qualquer parte seres humanos sobre-humanos que possam ser chamados de deuses – quando digo: ―temo a vingança dos deuses‖, isso mostra que eu (posso) quero dizer algo com isso, ou posso dar expressão a um sentimento, que não está necessariamente | Frazer: ―... That these observances are dictated by fear of the ghost of the slain seems certain; ...‖ (―...Que essas observâncias sejam ditadas pelo medo do fantasma do assassinado, parece certo;...‖){{hidden|<sup>76</sup>}} Mas então por que usa Frazer a palavra ―ghost‖ (fantasma)? Ele compreende, portanto, muito bem esta superstição, já que ele nos explica o que ela é com uma palavra supersticiosa e familiar para ele. Ou antes, ele teria que poder ver que também fala em nós algo em favor do modo de agir dos selvagens. – Quando eu, que não creio que haja em qualquer parte seres humanos sobre-humanos que possam ser chamados de deuses – quando digo: ―temo a vingança dos deuses‖, isso mostra que eu (posso) quero dizer algo com isso, ou posso dar expressão a um sentimento, que não está necessariamente | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 320)}} | |||
ligado àquela crença.{{hidden|<sup>77</sup>}} | ligado àquela crença.{{hidden|<sup>77</sup>}} | ||
Line 188: | Line 188: | ||
―E assim o coro aponta para uma lei secreta‖,{{hidden|<sup>82</sup>}} poder-se-ia dizer da coletânea de fatos frazereana. Esta lei, esta ideia, eu ''posso'' exprimir // apresentar// mediante uma hipótese evolutiva, ou também, em analogia com o esquema de uma planta, pelo esquema de uma cerimônia religiosa, ou tão só pelo agrupamento dos materiais factuais somente, numa apresentação ―''panorâmica''‖.{{hidden|<sup>83</sup>}} | ―E assim o coro aponta para uma lei secreta‖,{{hidden|<sup>82</sup>}} poder-se-ia dizer da coletânea de fatos frazereana. Esta lei, esta ideia, eu ''posso'' exprimir // apresentar// mediante uma hipótese evolutiva, ou também, em analogia com o esquema de uma planta, pelo esquema de uma cerimônia religiosa, ou tão só pelo agrupamento dos materiais factuais somente, numa apresentação ―''panorâmica''‖.{{hidden|<sup>83</sup>}} | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 321)}} | |||
O conceito de apresentação panorâmica{{hidden|<sup>84</sup>}} tem para nós{{hidden|<sup>85</sup>}} a mais fundamental importância. Ele marca a nossa forma de apresentação, a maneira como | O conceito de apresentação panorâmica{{hidden|<sup>84</sup>}} tem para nós{{hidden|<sup>85</sup>}} a mais fundamental importância. Ele marca a nossa forma de apresentação, a maneira como | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 281)}} | |||
nós vemos as coisas. (Uma espécie de ―visão de mundo‖ tal como é aparentemente típica do nosso tempo.{{hidden|<sup>86</sup>}} Spengler{{hidden|<sup>87</sup>}}) | nós vemos as coisas. (Uma espécie de ―visão de mundo‖ tal como é aparentemente típica do nosso tempo.{{hidden|<sup>86</sup>}} Spengler{{hidden|<sup>87</sup>}}) | ||
Line 199: | Line 199: | ||
Esta apresentação panorâmica proporciona o compreender // a compreensão //,{{hidden|<sup>88</sup>}} que consiste precisamente em ―ver as concatenações‖. Daí a importância do encontrar{{hidden|<sup>89</sup>}} os ''elos intermediários''.{{hidden|<sup>90</sup>}} | Esta apresentação panorâmica proporciona o compreender // a compreensão //,{{hidden|<sup>88</sup>}} que consiste precisamente em ―ver as concatenações‖. Daí a importância do encontrar{{hidden|<sup>89</sup>}} os ''elos intermediários''.{{hidden|<sup>90</sup>}} | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 282)}} | |||
Um elo intermediário hipotético, entretanto, nada deve fazer nesse caso senão dirigir a atenção para a semelhança, para a concatenação, entre os ''fatos''. Como se uma pessoa, quisesse ilustrar // ilustrasse // uma relação interna da forma circular com a elipse, transformasse gradualmente uma elipse num círculo; ''mas não para afirmar que uma certa elipse factualmente, historicamente, teria se originado de um círculo'' (hipótese evolutiva), senão somente para aguçar nosso olho para uma concatenação formal.{{hidden|<sup>91</sup>}} | Um elo intermediário hipotético, entretanto, nada deve fazer nesse caso senão dirigir a atenção para a semelhança, para a concatenação, entre os ''fatos''. Como se uma pessoa, quisesse ilustrar // ilustrasse // uma relação interna da forma circular com a elipse, transformasse gradualmente uma elipse num círculo; ''mas não para afirmar que uma certa elipse factualmente, historicamente, teria se originado de um círculo'' (hipótese evolutiva), senão somente para aguçar nosso olho para uma concatenação formal.{{hidden|<sup>91</sup>}} | ||
Line 205: | Line 205: | ||
Mas eu posso ver também a hipótese evolutiva{{hidden|<sup>92</sup>}} como um Nada além, como{{hidden|<sup>93</sup>}} a «uma» vestimenta de uma concatenação formal. | Mas eu posso ver também a hipótese evolutiva{{hidden|<sup>92</sup>}} como um Nada além, como{{hidden|<sup>93</sup>}} a «uma» vestimenta de uma concatenação formal. | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 322)}} | |||
Gostaria de dizer: nada mostra melhor nosso parentesco com aqueles selvagens do que Frazer ter à mão uma palavra tão familiar para ele e para nós como ―ghost‖ (fantasma)ou ―shade‖ (sombra), para descrever a maneira de ver daquela gente.{{hidden|<sup>94</sup>}} | Gostaria de dizer: nada mostra melhor nosso parentesco com aqueles selvagens do que Frazer ter à mão uma palavra tão familiar para ele e para nós como ―ghost‖ (fantasma)ou ―shade‖ (sombra), para descrever a maneira de ver daquela gente.{{hidden|<sup>94</sup>}} | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 250)}} | |||
(Claro que seria outra coisa se ele talvez descrevesse que os selvagens imaginavam // imaginam // que a sua cabeça cairia no chão se eles matassem um inimigo a pancadas. Aqui a ''nossa descrição'' não teria em si nada de supersticioso ou mágico.){{hidden|<sup>95</sup>}} | (Claro que seria outra coisa se ele talvez descrevesse que os selvagens imaginavam // imaginam // que a sua cabeça cairia no chão se eles matassem um inimigo a pancadas. Aqui a ''nossa descrição'' não teria em si nada de supersticioso ou mágico.){{hidden|<sup>95</sup>}} | ||
Line 221: | Line 221: | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 251)}} | |||
Nos antigos ritos temos o uso de uma linguagem de gestos extremamente cultivada.{{hidden|<sup>101</sup>}} | Nos antigos ritos temos o uso de uma linguagem de gestos extremamente cultivada.{{hidden|<sup>101</sup>}} | ||
Line 227: | Line 227: | ||
Quando leio Frazer gostaria de dizer a cada passo: todos esses processos, essas transformações do significado, nós temos ainda diante de nós na nossa linguagem verbal. Quando o que se dissimula no último feixe, no que é chamado de ‗lobo do grão‘, mas também o próprio feixe e o homem que o ata,{{hidden|<sup>102</sup>}} reconhecemos aqui um processo da linguagem bem familiar.{{hidden|<sup>103</sup>}} | Quando leio Frazer gostaria de dizer a cada passo: todos esses processos, essas transformações do significado, nós temos ainda diante de nós na nossa linguagem verbal. Quando o que se dissimula no último feixe, no que é chamado de ‗lobo do grão‘, mas também o próprio feixe e o homem que o ata,{{hidden|<sup>102</sup>}} reconhecemos aqui um processo da linguagem bem familiar.{{hidden|<sup>103</sup>}} | ||
{{MS reference|(TS 211, p. 281)}} | |||
Eu poderia imaginar que teria tido a alternativa de escolher um ser da terra como moradia para a minha alma, e que meu espírito tivesse escolhido essa criatura pouco vistosa (não-atraente) como seu assento e ponto de vista. Talvez porque para ele | Eu poderia imaginar que teria tido a alternativa de escolher um ser da terra como moradia para a minha alma, e que meu espírito tivesse escolhido essa criatura pouco vistosa (não-atraente) como seu assento e ponto de vista. Talvez porque para ele | ||
{{MS reference|(MS 110 p. 253)}} | |||
a escolha de um belo assento seria repugnante. Para isso, na realidade, o espírito teria que estar muito seguro de si.{{hidden|<sup>104</sup>}} | a escolha de um belo assento seria repugnante. Para isso, na realidade, o espírito teria que estar muito seguro de si.{{hidden|<sup>104</sup>}} | ||
Line 239: | Line 239: | ||
Na verdade, é importante que eu também tenha que «i me» apropriar do desprezo dos outros por mim, como uma parte essencial e significativa do mundo vista do meu lugar.{{hidden|<sup>106</sup>}} | Na verdade, é importante que eu também tenha que «i me» apropriar do desprezo dos outros por mim, como uma parte essencial e significativa do mundo vista do meu lugar.{{hidden|<sup>106</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 110, p. 254)}} | |||
Se uma pessoa tivesse nascido «i se» «deixado nascer» livremente numa árvore de uma floresta: então haveria aqueles que selecionariam a árvore mais bela ou a mais alta, aqueles que escolheriam a mais baixa e aqueles que escolheriam uma árvore média ou menor que uma média; e entendo que eles o fariam não por filistinismo, mas pela razão, ou pelo tipo de razão, pelo qual o outro escolheu a mais alta. Que o sentimento que temos pela nossa vida seja comparável ao da pessoa que pôde escolher o seu ponto de vista no mundo, está na base, creio, do mito – ou da crença – de que escolhemos o nosso corpo antes do nascimento.{{hidden|<sup>107</sup>}} | Se uma pessoa tivesse nascido «i se» «deixado nascer» livremente numa árvore de uma floresta: então haveria aqueles que selecionariam a árvore mais bela ou a mais alta, aqueles que escolheriam a mais baixa e aqueles que escolheriam uma árvore média ou menor que uma média; e entendo que eles o fariam não por filistinismo, mas pela razão, ou pelo tipo de razão, pelo qual o outro escolheu a mais alta. Que o sentimento que temos pela nossa vida seja comparável ao da pessoa que pôde escolher o seu ponto de vista no mundo, está na base, creio, do mito – ou da crença – de que escolhemos o nosso corpo antes do nascimento.{{hidden|<sup>107</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 110, p. 255)}} | |||
Line 251: | Line 251: | ||
[Quando estou furioso com algo, bato às vezes minha bengala na terra ou contra uma árvore etc. Mas não acredito que a terra seja culpada ou que a bengala possa ajudar em algo. ―Descarrego minha fúria‖. E todos os ritos são desse tipo. Essas ações podem ser denominadas como ações | [Quando estou furioso com algo, bato às vezes minha bengala na terra ou contra uma árvore etc. Mas não acredito que a terra seja culpada ou que a bengala possa ajudar em algo. ―Descarrego minha fúria‖. E todos os ritos são desse tipo. Essas ações podem ser denominadas como ações | ||
{{MS reference|(MS 110, p. 297)}} | |||
instintivas. – E uma explicação histórica do que talvez eu ou os meus antepassados acreditaram antes, de que bater na terra ajudava em algo, são fantasmagorias, são hipóteses supérfluas que ''nada'' explicam.{{hidden|<sup>113</sup>}} O importante é a semelhança do ato com o meu ato de castigar; porém, mais do que essa semelhança, nada se pode constatar. {{hidden|<sup>114</sup>}} | instintivas. – E uma explicação histórica do que talvez eu ou os meus antepassados acreditaram antes, de que bater na terra ajudava em algo, são fantasmagorias, são hipóteses supérfluas que ''nada'' explicam.{{hidden|<sup>113</sup>}} O importante é a semelhança do ato com o meu ato de castigar; porém, mais do que essa semelhança, nada se pode constatar. {{hidden|<sup>114</sup>}} | ||
Line 263: | Line 263: | ||
{{leftaside|ø\}} Pois o despertar do intelecto ocorreria com uma separação do ''solo'' originário, do fundamento originário da vida, de si. (O surgimento da ''escolha''.) | {{leftaside|ø\}} Pois o despertar do intelecto ocorreria com uma separação do ''solo'' originário, do fundamento originário da vida, de si. (O surgimento da ''escolha''.) | ||
{{MS reference|(MS 110, p. 298)}} | |||
{{leftaside|ø\}} (A forma do espírito que desperta é a veneração.){{hidden|<sup>118</sup>}} | {{leftaside|ø\}} (A forma do espírito que desperta é a veneração.){{hidden|<sup>118</sup>}} | ||
Line 273: | Line 273: | ||
Isto, naturalmente, não quer dizer que o povo acredite que o soberano tenha tais poderes, e o soberano sabe muito bem que ele não tem, ou então ele só não sabe disso se for um imbecil ou um demente. É que a noção do seu poder é de tal modo estabelecida, que ela pode coincidir com a experiência – do povo e a sua. Que assim, de algum modo, a hipocrisia desempenha um certo papel, | Isto, naturalmente, não quer dizer que o povo acredite que o soberano tenha tais poderes, e o soberano sabe muito bem que ele não tem, ou então ele só não sabe disso se for um imbecil ou um demente. É que a noção do seu poder é de tal modo estabelecida, que ela pode coincidir com a experiência – do povo e a sua. Que assim, de algum modo, a hipocrisia desempenha um certo papel, | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 1)}} | |||
só é verdadeiro na medida em que ela fica próxima da maioria das coisas que as pessoas fazem.{{hidden|<sup>120</sup>}} | só é verdadeiro na medida em que ela fica próxima da maioria das coisas que as pessoas fazem.{{hidden|<sup>120</sup>}} | ||
Line 281: | Line 281: | ||
Quando uma pessoa na nossa (ou melhor, na minha) companhia ri muito, eu pressiono quase espontaneamente os meus lábios, como se acreditasse que com isso ele poderia manter juntos os seus.{{hidden|<sup>122</sup>}} | Quando uma pessoa na nossa (ou melhor, na minha) companhia ri muito, eu pressiono quase espontaneamente os meus lábios, como se acreditasse que com isso ele poderia manter juntos os seus.{{hidden|<sup>122</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 2)}} | |||
170{{hidden|<sup>123</sup>}} | 170{{hidden|<sup>123</sup>}} | ||
Line 287: | Line 287: | ||
O absurdo consiste em que Frazer apresenta isso como se esses povos tivessem uma representação inteiramente falsa (ou até delirante) do curso da natureza, enquanto que eles só possuem uma interpretação peculiar dos fenômenos. Ou seja, se eles redigissem o seu conhecimento natural, não se diferenciaria ''fundamentalmente'' do nosso. Apenas a sua ''magia'' é diferente.{{hidden|<sup>124</sup>}} | O absurdo consiste em que Frazer apresenta isso como se esses povos tivessem uma representação inteiramente falsa (ou até delirante) do curso da natureza, enquanto que eles só possuem uma interpretação peculiar dos fenômenos. Ou seja, se eles redigissem o seu conhecimento natural, não se diferenciaria ''fundamentalmente'' do nosso. Apenas a sua ''magia'' é diferente.{{hidden|<sup>124</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 3)}} | |||
171{{hidden|<sup>125</sup>}} | 171{{hidden|<sup>125</sup>}} | ||
Line 295: | Line 295: | ||
Por simples que pareça: a diferença entre a magia e a ciência pode ser posta nos seguintes termos: | Por simples que pareça: a diferença entre a magia e a ciência pode ser posta nos seguintes termos: | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 4)}} | |||
nesta existe um progresso, mas não na magia. Na magia não existe um rumo evolutivo que esteja nela mesma.{{hidden|<sup>127</sup>}} | nesta existe um progresso, mas não na magia. Na magia não existe um rumo evolutivo que esteja nela mesma.{{hidden|<sup>127</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 5)}} | |||
[179{{hidden|<sup>128</sup>}} | [179{{hidden|<sup>128</sup>}} | ||
Line 307: | Line 307: | ||
Frazer não nota que aqui temos diante de nós as doutrinas de Platão e Schopenhauer.{{hidden|<sup>130</sup>}} | Frazer não nota que aqui temos diante de nós as doutrinas de Platão e Schopenhauer.{{hidden|<sup>130</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 6)}} | |||
Reencontramos todas as teorias ingênuas (infantis) na filosofia atual; somente não com o encantamento da ingenuidade.{{hidden|<sup>131</sup>}} | Reencontramos todas as teorias ingênuas (infantis) na filosofia atual; somente não com o encantamento da ingenuidade.{{hidden|<sup>131</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 7)}}] | |||
614{{hidden|<sup>132</sup>}} | 614{{hidden|<sup>132</sup>}} | ||
Line 318: | Line 318: | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 8)}} | |||
Em todas essas práticas certamente vê-se algo que ''se assemelha'' com a associação de ideias e lhe é aparentado.{{hidden|<sup>136</sup>}} Poder-se-ia falar de uma associação de práticas. | Em todas essas práticas certamente vê-se algo que ''se assemelha'' com a associação de ideias e lhe é aparentado.{{hidden|<sup>136</sup>}} Poder-se-ia falar de uma associação de práticas. | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 9)}} | |||
618 137 | 618 137 | ||
Line 328: | Line 328: | ||
Nada fala a favor de por que a fogueira deveria ser circundada com essa auréola. E que estranho, o que quer dizer na realidade ―parece provir do céu‖? De que céu? Não, não é de nenhum modo evidente que a fogueira venha a ser considerada assim – mas ela foi justamente considerada assim.{{hidden|<sup>138</sup>}} | Nada fala a favor de por que a fogueira deveria ser circundada com essa auréola. E que estranho, o que quer dizer na realidade ―parece provir do céu‖? De que céu? Não, não é de nenhum modo evidente que a fogueira venha a ser considerada assim – mas ela foi justamente considerada assim.{{hidden|<sup>138</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 10)}} | |||
618 | 618 | ||
Line 335: | Line 335: | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 11)}} | |||
da própria prática «moderna», que nos parece tenebroso, e de que para nós fatos conhecidos de sacrifícios humanos indicam apenas a direção em que devemos ver tal prática.{{hidden|<sup>140</sup>}} Quando falo da natureza interna da prática, me refiro a todas as circunstâncias pelas quais ela é executada e que não estão compreendidas no relato desse festival, pois elas não consistem tanto em determinadas ações que a caracterizam, quanto nas que se podem denominar como o espírito do festival,{{hidden|<sup>141</sup>}} que seria descrito quando se descreve, por exemplo, o tipo de gente que dele participa, seus outros tipos de ação, isto é, seu caráter; o tipo dos jogos que eles costumam jogar. Então se veria que o tenebroso está no próprio caráter desses homens. {{hidden|<sup>142</sup>}} | da própria prática «moderna», que nos parece tenebroso, e de que para nós fatos conhecidos de sacrifícios humanos indicam apenas a direção em que devemos ver tal prática.{{hidden|<sup>140</sup>}} Quando falo da natureza interna da prática, me refiro a todas as circunstâncias pelas quais ela é executada e que não estão compreendidas no relato desse festival, pois elas não consistem tanto em determinadas ações que a caracterizam, quanto nas que se podem denominar como o espírito do festival,{{hidden|<sup>141</sup>}} que seria descrito quando se descreve, por exemplo, o tipo de gente que dele participa, seus outros tipos de ação, isto é, seu caráter; o tipo dos jogos que eles costumam jogar. Então se veria que o tenebroso está no próprio caráter desses homens. {{hidden|<sup>142</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 12)}} | |||
619143 | 619143 | ||
Line 348: | Line 348: | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 13)}} | |||
Por isso, então, a profundidade está somente no pensamento de uma filiação. Entretanto, esta pode ser totalmente incerta, e poder-se-ia dizer: ―para que tomar cuidados «ocupar-se» com uma coisa tão incerta‖ (como uma Elsa esperta{{hidden|<sup>146</sup>}} que olha para trás)? Mas não se trata de tais preocupações. – Sobretudo: de onde vem a segurança de que uma tal prática tem que ser muito antiga (quais são os nossos dados, qual é a verificação)? Entretanto nós temos uma segurança, não poderíamos estar equivocados e ter sido convencidos «i historicamente» de um equívoco? Certamente, mas então permanece sempre, claro, alguma coisa da qual estamos seguros. Poderíamos, «i portanto», dizer: ―Bem, nesse caso a procedência poderia ser outra, mas em geral ela é certamente a pré- histórica‖. Aquilo que para nós é uma ''evidência'' disto, tem que conter a profundidade dessa suposição. E essa evidência é novamente psicológica «i e não-hipotética».{{hidden|<sup>147</sup>}} Se eu digo, por exemplo: a profundidade nessa prática está na sua procedência, ''se'' ela aconteceu assim. Então, a profundidade <s>deve</s> está no pensamento de uma tal procedência, ou a profundidade é «i ela mesma» apenas hipotética e só se pode dizer: ''se'' isso aconteceu assim, | Por isso, então, a profundidade está somente no pensamento de uma filiação. Entretanto, esta pode ser totalmente incerta, e poder-se-ia dizer: ―para que tomar cuidados «ocupar-se» com uma coisa tão incerta‖ (como uma Elsa esperta{{hidden|<sup>146</sup>}} que olha para trás)? Mas não se trata de tais preocupações. – Sobretudo: de onde vem a segurança de que uma tal prática tem que ser muito antiga (quais são os nossos dados, qual é a verificação)? Entretanto nós temos uma segurança, não poderíamos estar equivocados e ter sido convencidos «i historicamente» de um equívoco? Certamente, mas então permanece sempre, claro, alguma coisa da qual estamos seguros. Poderíamos, «i portanto», dizer: ―Bem, nesse caso a procedência poderia ser outra, mas em geral ela é certamente a pré- histórica‖. Aquilo que para nós é uma ''evidência'' disto, tem que conter a profundidade dessa suposição. E essa evidência é novamente psicológica «i e não-hipotética».{{hidden|<sup>147</sup>}} Se eu digo, por exemplo: a profundidade nessa prática está na sua procedência, ''se'' ela aconteceu assim. Então, a profundidade <s>deve</s> está no pensamento de uma tal procedência, ou a profundidade é «i ela mesma» apenas hipotética e só se pode dizer: ''se'' isso aconteceu assim, | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 14)}} | |||
então foi uma história profunda e tenebrosa. Quero dizer: o tenebroso, o profundo, não reside no fato de ela ter ocorrido dessa forma, pois talvez ela não tenha ocorrido assim; nem tampouco que ela talvez ou realmente tenha sido assim, senão naquilo que me dá fundamento para isso supor tal suposição.{{hidden|<sup>148</sup>}} Claro, de onde vem na realidade o profundo e o tenebroso no sacrifício humano? São pois só os sofrimentos da vítima que nos impressionam? Doenças de todo tipo, que são ligadas a sofrimentos do mesmo tipo, não provocam ''contudo'' essa impressão. Não, esse profundo e tenebroso não são evidentes se nós só ficamos conhecendo a história da ação manifestada, pelo contrário ''nós'' o reintroduzimos a partir de uma experiência da nossa interioridade.{{hidden|<sup>149</sup>}} | então foi uma história profunda e tenebrosa. Quero dizer: o tenebroso, o profundo, não reside no fato de ela ter ocorrido dessa forma, pois talvez ela não tenha ocorrido assim; nem tampouco que ela talvez ou realmente tenha sido assim, senão naquilo que me dá fundamento para isso supor tal suposição.{{hidden|<sup>148</sup>}} Claro, de onde vem na realidade o profundo e o tenebroso no sacrifício humano? São pois só os sofrimentos da vítima que nos impressionam? Doenças de todo tipo, que são ligadas a sofrimentos do mesmo tipo, não provocam ''contudo'' essa impressão. Não, esse profundo e tenebroso não são evidentes se nós só ficamos conhecendo a história da ação manifestada, pelo contrário ''nós'' o reintroduzimos a partir de uma experiência da nossa interioridade.{{hidden|<sup>149</sup>}} | ||
Line 358: | Line 358: | ||
O fato de que a sorte seja tirada de um bolo tem (também) algo de particularmente espantoso (próximo de uma traição por um beijo), e que isso nos cause a impressão de ser particularmente espantoso, tem novamente um significado essencial para a investigação dessas | O fato de que a sorte seja tirada de um bolo tem (também) algo de particularmente espantoso (próximo de uma traição por um beijo), e que isso nos cause a impressão de ser particularmente espantoso, tem novamente um significado essencial para a investigação dessas | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 15)}} | |||
práticas {de uma tal prática}.{{hidden|<sup>150</sup>}} | práticas {de uma tal prática}.{{hidden|<sup>150</sup>}} | ||
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O que nos previne, porém, contra a suposição de que o Festival de Beltane tivesse sido sempre celebrado na forma presente (ou do passado recente)? Poder-se-ia dizer: é muito sem sentido para ter sido | O que nos previne, porém, contra a suposição de que o Festival de Beltane tivesse sido sempre celebrado na forma presente (ou do passado recente)? Poder-se-ia dizer: é muito sem sentido para ter sido | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 16)}} | |||
inventado assim. Não é como quando vejo uma ruína e digo: isso deve ter sido alguma vez uma casa, pois ninguém teria erguido um monte já formado de pedras talhadas e irregulares? E se me perguntassem: como é que sabes disso, só poderia então dizer: minha experiência com as pessoas me ensinou. Sim, mesmo onde realmente se constroem ruínas, elas tomam a forma de casas desmoronadas.{{hidden|<sup>153</sup>}} | inventado assim. Não é como quando vejo uma ruína e digo: isso deve ter sido alguma vez uma casa, pois ninguém teria erguido um monte já formado de pedras talhadas e irregulares? E se me perguntassem: como é que sabes disso, só poderia então dizer: minha experiência com as pessoas me ensinou. Sim, mesmo onde realmente se constroem ruínas, elas tomam a forma de casas desmoronadas.{{hidden|<sup>153</sup>}} | ||
Line 377: | Line 377: | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 17)}} | |||
Mas não poderia eu igualmente perguntar: se vejo alguém sendo assassinado – isso me impressiona simplesmente porque vejo ou vem primeiro a hipótese de que aqui uma pessoa é assassinada?{{hidden|<sup>155</sup>}} | Mas não poderia eu igualmente perguntar: se vejo alguém sendo assassinado – isso me impressiona simplesmente porque vejo ou vem primeiro a hipótese de que aqui uma pessoa é assassinada?{{hidden|<sup>155</sup>}} | ||
Line 385: | Line 385: | ||
Assim como o Festival de Beltane chegou até nós, ele seria um espetáculo e se assemelharia a quando as crianças brincam de ladrão. Mas não é assim. Pois mesmo estando combinado que a equipe que consegue salvar a vítima ganha, ainda assim o que ocorre tem sempre um acréscimo de vivacidade que a mera apresentação dramática não tem. – Porém mesmo quando se trata apenas de uma apresentação totalmente fria, nos perguntamos com inquietação: o que quer dizer esta apresentação, qual é o seu ''sentido''?! E ela poderia, independentemente de qualquer interpretação, nos inquietar pela sua própria falta de sentido. (O que mostra que tipo de fundamento pode ter uma tal inquietação).{{hidden|<sup>157</sup>}} Suponhamos talvez agora uma interpretação inócua: o | Assim como o Festival de Beltane chegou até nós, ele seria um espetáculo e se assemelharia a quando as crianças brincam de ladrão. Mas não é assim. Pois mesmo estando combinado que a equipe que consegue salvar a vítima ganha, ainda assim o que ocorre tem sempre um acréscimo de vivacidade que a mera apresentação dramática não tem. – Porém mesmo quando se trata apenas de uma apresentação totalmente fria, nos perguntamos com inquietação: o que quer dizer esta apresentação, qual é o seu ''sentido''?! E ela poderia, independentemente de qualquer interpretação, nos inquietar pela sua própria falta de sentido. (O que mostra que tipo de fundamento pode ter uma tal inquietação).{{hidden|<sup>157</sup>}} Suponhamos talvez agora uma interpretação inócua: o | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 18)}} | |||
sorteio é simplesmente feito, e com isso haveria divertimento em alguém poder ser ameaçado de ser jogado no fogo, algo que não seria agradável; assim, o Festival de Beltane seria muito semelhante a quaisquer diversões em que certas atrocidades da sociedade têm que ser toleradas e, tais como são, satisfazem uma necessidade. Com uma explicação como essa, o Festival de Beltane perderia realmente todo o mistério, se ele mesmo não se afastasse tanto da ação quanto da atmosfera de familiaridade de brincadeiras como as de ladrão etc.{{hidden|<sup>158</sup>}} | sorteio é simplesmente feito, e com isso haveria divertimento em alguém poder ser ameaçado de ser jogado no fogo, algo que não seria agradável; assim, o Festival de Beltane seria muito semelhante a quaisquer diversões em que certas atrocidades da sociedade têm que ser toleradas e, tais como são, satisfazem uma necessidade. Com uma explicação como essa, o Festival de Beltane perderia realmente todo o mistério, se ele mesmo não se afastasse tanto da ação quanto da atmosfera de familiaridade de brincadeiras como as de ladrão etc.{{hidden|<sup>158</sup>}} | ||
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Por que não deve ser realmente só o ''pensamento'' (ou ao menos parcialmente) que me impressiona? Não são as representações, com efeito, temíveis? Eu poderia pretender que não fosse horripilante o pensamento de que o bolo com botões foi servido para sortear a morte da vítima? Não tem o ''pensamento'' | Por que não deve ser realmente só o ''pensamento'' (ou ao menos parcialmente) que me impressiona? Não são as representações, com efeito, temíveis? Eu poderia pretender que não fosse horripilante o pensamento de que o bolo com botões foi servido para sortear a morte da vítima? Não tem o ''pensamento'' | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 19)}} | |||
algo de temível? – Sim, mas o que vejo nesses relatos é obtido, claro, pela evidência, mas também por aquela que não parece estar imediatamente ligada a eles: pelo pensamento sobre o homem e seu passado, por toda a estranheza{{hidden|<sup>160</sup>}} que vejo, vi e ouvi em mim e no outro.{{hidden|<sup>161</sup>}} | algo de temível? – Sim, mas o que vejo nesses relatos é obtido, claro, pela evidência, mas também por aquela que não parece estar imediatamente ligada a eles: pelo pensamento sobre o homem e seu passado, por toda a estranheza{{hidden|<sup>160</sup>}} que vejo, vi e ouvi em mim e no outro.{{hidden|<sup>161</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 20)}} | |||
[640{{hidden|<sup>162</sup>}} | [640{{hidden|<sup>162</sup>}} | ||
Line 405: | Line 405: | ||
Todas essas ''diferentes'' práticas mostram que não se trata aqui da filiação de uma a outra, | Todas essas ''diferentes'' práticas mostram que não se trata aqui da filiação de uma a outra, | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 21)}} | |||
mas de um espírito comum. Poder-se-ia inventar (fabricar) todas essas mesmas cerimônias. E o espírito pelo qual se as inventaria, seria precisamente o seu espírito comum.{{hidden|<sup>164</sup>}} | mas de um espírito comum. Poder-se-ia inventar (fabricar) todas essas mesmas cerimônias. E o espírito pelo qual se as inventaria, seria precisamente o seu espírito comum.{{hidden|<sup>164</sup>}} | ||
Line 415: | Line 415: | ||
Assim como existem ―teorias sexuais infantis‖, também há teorias infantis em geral. Isso não quer dizer que tudo o que uma criança faz, saia ''de'' uma | Assim como existem ―teorias sexuais infantis‖, também há teorias infantis em geral. Isso não quer dizer que tudo o que uma criança faz, saia ''de'' uma | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 22)}} | |||
teoria infantil tomada como seu fundamento.{{hidden|<sup>167</sup>}} | teoria infantil tomada como seu fundamento.{{hidden|<sup>167</sup>}} | ||
Line 421: | Line 421: | ||
O correto e interessante não é dizer: isto saiu daquilo, senão: poderia ter saído assim.{{hidden|<sup>168</sup>}} | O correto e interessante não é dizer: isto saiu daquilo, senão: poderia ter saído assim.{{hidden|<sup>168</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 23)}} | |||
643{{hidden|<sup>169</sup>}} | 643{{hidden|<sup>169</sup>}} | ||
Line 427: | Line 427: | ||
Que o fogo tenha sido usado para a purificação, está claro. Porém, nada pode ser mais provável do que o fato de que as pessoas que pensam associaram mais tarde as cerimônias de purificação ao sol, mesmo onde originalmente elas tinham sido pensadas só no sentido de purificação. Se um pensamento se impõe a uma pessoa | Que o fogo tenha sido usado para a purificação, está claro. Porém, nada pode ser mais provável do que o fato de que as pessoas que pensam associaram mais tarde as cerimônias de purificação ao sol, mesmo onde originalmente elas tinham sido pensadas só no sentido de purificação. Se um pensamento se impõe a uma pessoa | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 24)}} | |||
(fogo-purificação) e a um outro se impõe outro pensamento (fogo-sol), o que pode ser mais provável que a uma pessoa se imponham dois pensamentos?{{hidden|<sup>170</sup>}} Os eruditos que sempre gostariam de ter ''uma'' teoria!!!{{hidden|<sup>171</sup>}} | (fogo-purificação) e a um outro se impõe outro pensamento (fogo-sol), o que pode ser mais provável que a uma pessoa se imponham dois pensamentos?{{hidden|<sup>170</sup>}} Os eruditos que sempre gostariam de ter ''uma'' teoria!!!{{hidden|<sup>171</sup>}} | ||
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Mesmo se não houvesse conhecimento de um tal pensamento de ligação entre purificação e sol, seria possível supor que ele de alguma maneira se apresentaria.{{hidden|<sup>172</sup>}} | Mesmo se não houvesse conhecimento de um tal pensamento de ligação entre purificação e sol, seria possível supor que ele de alguma maneira se apresentaria.{{hidden|<sup>172</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 25)}} | |||
680{{hidden|<sup>173</sup>}} ―soul-stone‖ (―pedra-alma‖). Aqui se vê como trabalha uma tal hipótese.{{hidden|<sup>174</sup>}} | 680{{hidden|<sup>173</sup>}} ―soul-stone‖ (―pedra-alma‖). Aqui se vê como trabalha uma tal hipótese.{{hidden|<sup>174</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 26)}} | |||
681{{hidden|<sup>175</sup>}} | 681{{hidden|<sup>175</sup>}} | ||
Line 445: | Line 445: | ||
Isso indicaria{{hidden|<sup>176</sup>}} que há como fundamento uma verdade e não uma superstição. (Na realidade, diante do cientista tolo, é fácil cair no espírito contestatório.){{hidden|<sup>177</sup>}} Mas poderia muito bem ser o caso de que o corpo completamente sem cabelos nos nos induzisse em algum sentido a perder o auto-respeito. (Irmãos Karamazoff.) Não há dúvida de que uma mutilação que aos nossos | Isso indicaria{{hidden|<sup>176</sup>}} que há como fundamento uma verdade e não uma superstição. (Na realidade, diante do cientista tolo, é fácil cair no espírito contestatório.){{hidden|<sup>177</sup>}} Mas poderia muito bem ser o caso de que o corpo completamente sem cabelos nos nos induzisse em algum sentido a perder o auto-respeito. (Irmãos Karamazoff.) Não há dúvida de que uma mutilação que aos nossos | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 27)}} | |||
olhos parece indigna, risível, pode roubar toda a vontade de nos defender. Como muitas vezes nos constrangemos – ou pelo menos muitas pessoas (eu) – por causa da nossa inferioridade física ou estética.{{hidden|<sup>178</sup>}} | olhos parece indigna, risível, pode roubar toda a vontade de nos defender. Como muitas vezes nos constrangemos – ou pelo menos muitas pessoas (eu) – por causa da nossa inferioridade física ou estética.{{hidden|<sup>178</sup>}} | ||
{{MS reference|(MS 143, p. 28)}}] |