Notas Ditadas a G.E. Moore na Noruega: Difference between revisions

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|translator=Tradução de {{person link|Melina Bentes }}
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|notes=Esta tradução está baseada na edição ''Notes Dictated to G. E. Moore in Norway'' by Ludwig Wittgenstein. Appendix II from Notebooks 1914-1916, edited by G. H. Von Wright and G. E. M. Anscombe, Harper Torchbooks, New York: Harper & Row Publishers, 2nd edition, 1984, e foi revisada por Cristiano Moita.
|notes=Esta tradução está baseada na edição ''Notes Dictated to G. E. Moore in Norway'' by Ludwig Wittgenstein. Appendix II from Notebooks 1914-1916, edited by G. H. Von Wright and G. E. M. Anscombe, Harper Torchbooks, New York: Harper & Row Publishers, 2nd edition, 1984, e foi revisada por Cristiano Moita. O texto da língua original está em domínio público no seu país de origem e em outros países e áreas onde o período de proteção dos direitos autorais é igual à vida do autor mais 70 anos ou menos. Esta tradução está publicada no website do Projeto Ludwig Wittgenstein sob os termos da licença [https://creativecommons.org/licenses/by-sa/4.0/deed.pt Creative Commons Atribuição-CompartilhaIgual].  
O texto da língua original está em domínio público no seu país de origem e em outros países e áreas onde o período de proteção dos direitos autorais é igual à vida do autor mais 70 anos ou menos. Esta tradução está publicada no website do Projeto Ludwig Wittgenstein sob os termos da licença [https://creativecommons.org/licenses/by-sa/4.0/deed.pt Creative Commons Atribuição-CompartilhaIgual].  
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Abril, 1914
{{p right|Abril, 1914}}


Proposições assim chamadas lógicas ''mostram'' [as] propriedades lógicas da linguagem, e portanto, do Universo, mas nada ''dizem.'' [Cf. 6.12.]
Proposições assim chamadas lógicas ''mostram'' [as] propriedades lógicas da linguagem, e portanto, do Universo, mas nada ''dizem.'' [Cf. 6.12.]
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Toda proposição ''real mostra'' alguma coisa, além do que diz, sobre o Universo: ''pois'', se ela não tem sentido, não pode ser utilizada; e se tem sentido, ela espelha alguma propriedade lógica do Universo.
Toda proposição ''real mostra'' alguma coisa, além do que diz, sobre o Universo: ''pois'', se ela não tem sentido, não pode ser utilizada; e se tem sentido, ela espelha alguma propriedade lógica do Universo.


E.g., considere 𝜙a, 𝜙a '''⊃''' 𝜓a, 𝜓a. Por meramente olhar esses três [símbolos], eu posso perceber que 3 se segue de 1 e 2; i.e. eu posso perceber o que é chamado de verdade de uma proposição lógica, isto é, d[a] proposição 𝜙a. 𝜙a '''⊃''' 𝜓a : '''⊃''' : 𝜓a. Mas isso ''não'' é uma proposição; pois, ao perceber que isso é uma tautologia, eu posso ver o que eu já vi ao olhar as três proposições: a diferença é que ''agora'' eu vejo que AQUILO é uma tautologia. [Cf. 6.1221.].
E.g., considere ϕa, ϕa '''⊃''' ψa, ψa. Por meramente olhar esses três [símbolos], eu posso perceber que 3 se segue de 1 e 2; i.e. eu posso perceber o que é chamado de verdade de uma proposição lógica, isto é, d[a] proposição ϕa. ϕa '''⊃''' ψa : '''⊃''' : ψa. Mas isso ''não'' é uma proposição; pois, ao perceber que isso é uma tautologia, eu posso ver o que eu já vi ao olhar as três proposições: a diferença é que ''agora'' eu vejo que AQUILO é uma tautologia. [Cf. 6.1221.].


Nós queremos dizer que, para entender [o] dito acima, quais propriedades um símbolo deve ter, para que seja uma tautologia.
Nós queremos dizer que, para entender [o] dito acima, quais propriedades um símbolo deve ter, para que seja uma tautologia.
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''Agora'', veremos como analisar corretamente as proposições em que “coisa”, “relação”, etc., ocorrem.
''Agora'', veremos como analisar corretamente as proposições em que “coisa”, “relação”, etc., ocorrem.


(1) Considere 𝜙x. Nós queremos explicar o significado de ‘Em “𝜙x” uma ''coisa'' [se] simboliza’. A análise é:一
(1) Considere ϕx. Nós queremos explicar o significado de ‘Em “ϕx” uma ''coisa'' [se] simboliza’. A análise é:一


(∃y) . y simboliza . y = “x” . “𝜙x”
{{p indent|(∃y) . y simboliza . y <nowiki>=</nowiki> “x” . “ϕx”}}


[“x” é o nome de y: “𝜙x” = ‘“𝜙” está na esquerda de “x”’ e ''diz'' 𝜙x.]
[“x” é o nome de y: “ϕx” = ‘“ϕ” está na esquerda de “x”’ e ''diz'' ϕx.]


N.B. “x” não pode ser o nome desse rascunho original y, porque isso não é uma coisa: mas pode ser o nome de ''uma coisa''; e nós precisamos entender que o que estamos fazendo é explicar o que significaria dizer de um símbolo ideal, que consistia efetivamente no fato de uma ''coisa'' estar à esquerda de outra, ��que nele uma ''coisa'' simbolizava.
N.B. “x” não pode ser o nome desse rascunho original y, porque isso não é uma coisa: mas pode ser o nome de ''uma coisa''; e nós precisamos entender que o que estamos fazendo é explicar o que significaria dizer de um símbolo ideal, que consistia efetivamente no fato de uma ''coisa'' estar à esquerda de outra, ��que nele uma ''coisa'' simbolizava.


(N.B. N[a] expressão (∃y).𝜙y, alguém está apto a dizer [que] isso significa “Existe uma ''coisa'' tal que…”. Mas, na verdade, nós deveríamos dizer “Existe um y, tal que…”; o fato de que y simboliza expressar o que queremos dizer.)
(N.B. N[a] expressão (∃y).ϕy, alguém está apto a dizer [que] isso significa “Existe uma ''coisa'' tal que…”. Mas, na verdade, nós deveríamos dizer “Existe um y, tal que…”; o fato de que y simboliza expressar o que queremos dizer.)


Em geral: Quando tais proposições são analisadas, enquanto as palavras “coisa”, “fato”, etc. vão desaparecer, vão aparecer, em vez delas, um novo símbolo, da mesma forma que aquele do qual estamos falando; e, por isso, será imediatamente óbvio que nós ''não podemos'' obter um tipo de proposição a partir de outra por substituição.
Em geral: Quando tais proposições são analisadas, enquanto as palavras “coisa”, “fato”, etc. vão desaparecer, vão aparecer, em vez delas, um novo símbolo, da mesma forma que aquele do qual estamos falando; e, por isso, será imediatamente óbvio que nós ''não podemos'' obter um tipo de proposição a partir de outra por substituição.
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Se você tivesse qualquer proposição não analisável na qual ocorressem nomes e relações particulares (e proposição ''não analisável'' = uma na qual apenas símbolos fundamentais = aqueles que não são sujeitos a ''definição,'' ocorrem) então você pode sempre formar dela uma proposição da forma (∃x, y, R). xRy, que embora não contenha nenhum nome e relação particulares, é não analisável.
Se você tivesse qualquer proposição não analisável na qual ocorressem nomes e relações particulares (e proposição ''não analisável'' = uma na qual apenas símbolos fundamentais = aqueles que não são sujeitos a ''definição,'' ocorrem) então você pode sempre formar dela uma proposição da forma (∃x, y, R). xRy, que embora não contenha nenhum nome e relação particulares, é não analisável.


(2) O ponto pode ser abordado como se segue. Pegue 𝜙a e 𝜙A: e pergunte o que se quer dizer com “Tem uma coisa em 𝜙a, e uma complexa em 𝜙A”?
(2) O ponto pode ser abordado como se segue. Pegue ϕa e ϕA: e pergunte o que se quer dizer com “Tem uma coisa em ϕa, e uma complexa em ϕA”?


{{p indent|(1) quer dizer: (∃x) . 𝜙x . x = a}}
{{p indent|(1) quer dizer: (∃x) . ϕx . x <nowiki>=</nowiki> a}}


{{p indent|(2) quer dizer: (∃x, 𝜓) . 𝜙A = 𝜓x . 𝜙x<ref>𝜉 é a marca de Frege de um ''Argumentstelle'' [posição do argumento], para mostrar que 𝜓 é uma ''Funktionsbuchstabe'' [letra de função] [Edd.].</ref>}}
{{p indent|(2) quer dizer: (∃x, ψξ) . ϕA <nowiki>=</nowiki> ψx . ϕx<ref>ξ é a marca de Frege de um ''Argumentstelle'' [posição do argumento], para mostrar que ψ é uma ''Funktionsbuchstabe'' [letra de função] [Edd.].</ref>}}


''Uso de proposições lógicas''. Você pode ter uma tão complicada que você não consegue, ao olhar para ela, ver que é uma tautologia; mas você mostrou que pode ser derivada por determinas operações a partir de certas outras proposições de acordo com nossa regra para construir tautologias; e assim você está habilitado para ver que uma coisa se segue da outra, quando você não seria capaz de ver isso de outro modo. E.g., se nossa tautologia é d[a] forma p ⊃ q você pode ver que p se segue de p; e assim por diante.
''Uso de proposições lógicas''. Você pode ter uma tão complicada que você não consegue, ao olhar para ela, ver que é uma tautologia; mas você mostrou que pode ser derivada por determinas operações a partir de certas outras proposições de acordo com nossa regra para construir tautologias; e assim você está habilitado para ver que uma coisa se segue da outra, quando você não seria capaz de ver isso de outro modo. E.g., se nossa tautologia é d[a] forma p ⊃ q você pode ver que p se segue de p; e assim por diante.
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O símbolo para uma tautologia, de qualquer forma que colocamos, e.g., quer omitindo o polo a ou omitindo o b, seria sempre capaz de ser usado como o símbolo para uma contradição; apenas não na mesma linguagem.
O símbolo para uma tautologia, de qualquer forma que colocamos, e.g., quer omitindo o polo a ou omitindo o b, seria sempre capaz de ser usado como o símbolo para uma contradição; apenas não na mesma linguagem.


A razão pela qual ~x é sem significado é simplesmente que nós demos nenhum sentido para o símbolo ~. I.e. enquanto 𝜙x e 𝜙p parecem ser do mesmo tipo, eles não são porque, para dar um significado para ~x, você deveria ter alguma ''propriedade'' ~. O que simboliza em 𝜙 é ''que'' 𝜙 está à esquerda de ''um'' nome próprio e obviamente isso não é assim em ~p. O que é comum a todas proposições em que o nome de uma propriedade (para falar frouxamente) ocorre é que esse nome está à esquerda de uma ''forma-nome.''
A razão pela qual ~x é sem significado é simplesmente que nós demos nenhum sentido para o símbolo ~. I.e. enquanto ϕx e ϕp parecem ser do mesmo tipo, eles não são porque, para dar um significado para ~x, você deveria ter alguma ''propriedade'' ~. O que simboliza em ϕ é ''que'' ϕ está à esquerda de ''um'' nome próprio e obviamente isso não é assim em ~p. O que é comum a todas proposições em que o nome de uma propriedade (para falar frouxamente) ocorre é que esse nome está à esquerda de uma ''forma-nome.''


A razão pela qual, e.g., parece que “Platão Sócrates” pode ter significado, enquanto “Abracadabra Sócrates” nunca vai ser suspeito de ter um, é porque nós sabemos que “Platão” tem um e não observamos que, para que a frase inteira devesse ter um, o que é necessário ''não'' é que “Platão” devesse ter um, mas que o fato de ''que'' “Platão estar à esquerda de um ''nome'' deve”.
A razão pela qual, e.g., parece que “Platão Sócrates” pode ter significado, enquanto “Abracadabra Sócrates” nunca vai ser suspeito de ter um, é porque nós sabemos que “Platão” tem um e não observamos que, para que a frase inteira devesse ter um, o que é necessário ''não'' é que “Platão” devesse ter um, mas que o fato de ''que'' “Platão estar à esquerda de um ''nome'' deve”.
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A razão pela qual “A propriedade de não ser verde não é verde” é ''sem sentido,'' porque nós apenas damos significado ao fato de que “verde” está à direita de um nome; e “a propriedade de não ser verde” obviamente não é ''isso.''
A razão pela qual “A propriedade de não ser verde não é verde” é ''sem sentido,'' porque nós apenas damos significado ao fato de que “verde” está à direita de um nome; e “a propriedade de não ser verde” obviamente não é ''isso.''


𝜙 não pode possivelmente estar à esquerda de (ou em qualquer outra relação com) o símbolo de uma propriedade. Então o símbolo de uma propriedade, e.g., 𝜓x é ''que'' 𝜓 está à esquerda de uma forma-nome, e outro símbolo 𝜙 não pode possivelmente estar à esquerda de tal ''fato:'' se pudesse, nós deveríamos ter uma linguagem ilógica, o que é impossível.
ϕ não pode possivelmente estar à esquerda de (ou em qualquer outra relação com) o símbolo de uma propriedade. Então o símbolo de uma propriedade, e.g., ψx é ''que'' ψ está à esquerda de uma forma-nome, e outro símbolo ϕ não pode possivelmente estar à esquerda de tal ''fato:'' se pudesse, nós deveríamos ter uma linguagem ilógica, o que é impossível.


p é falso = ~(p é verdadeiro) Def.
p é falso = ~(p é verdadeiro) Def.
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Relações ''internas'' são relações entre tipos, que não podem ser expressadas em proposições, mas estão todas à mostra nos símbolos em si mesmos e podem ser exibidas sistematicamente em tautologias. Por que nós a chamamos de “relações” é porque proposições lógicas têm uma relação análoga a elas, para a qual proposições propriamente relacionais têm com relações.
Relações ''internas'' são relações entre tipos, que não podem ser expressadas em proposições, mas estão todas à mostra nos símbolos em si mesmos e podem ser exibidas sistematicamente em tautologias. Por que nós a chamamos de “relações” é porque proposições lógicas têm uma relação análoga a elas, para a qual proposições propriamente relacionais têm com relações.


Proposições podem ter muitas relações internas diferentes umas com as outras. ''A'' única que nos autoriza deduzir uma da outra é se, digamos, elas são 𝜙a e 𝜙a 𝜓a, então 𝜙a.𝜙a 𝜓a: ⊃ : 𝜓a é uma tautologia.
Proposições podem ter muitas relações internas diferentes umas com as outras. ''A'' única que nos autoriza deduzir uma da outra é se, digamos, elas são ϕa e ϕa ψa, então ϕa.ϕa ψa: ⊃ : ψa é uma tautologia.


O símbolo de identidade expressa uma relação interna entre a função e o seu argumento: i.e. 𝜙a = (∃x) . 𝜙x.x = a.
O símbolo de identidade expressa uma relação interna entre a função e o seu argumento: i.e. ϕa = (∃x) . ϕx.x = a.


A proposição (∃x) . 𝜙x . x = a : = : 𝜙a pode ser vista como uma tautologia, se alguém expressas as ''condições'' de verdade de (∃x) . 𝜙x . x = a, sucessivamente, e.g., dizendo: isso é verdade ''se'' isso e aquilo, e isso novamente é verdade ''se'' isso e aquilo, etc., pois (∃x) . 𝜙x . x = a; e então também para 𝜙a. Expressar a questão desse modo é uma notação desajeitada, da qual a ab-notação é uma tradução mais arrumada.  
A proposição (∃x) . ϕx . x = a : = : ϕa pode ser vista como uma tautologia, se alguém expressas as ''condições'' de verdade de (∃x) . ϕx . x = a, sucessivamente, e.g., dizendo: isso é verdade ''se'' isso e aquilo, e isso novamente é verdade ''se'' isso e aquilo, etc., pois (∃x) . ϕx . x = a; e então também para ϕa. Expressar a questão desse modo é uma notação desajeitada, da qual a ab-notação é uma tradução mais arrumada.  


O que simboliza em um símbolo é o que é comum a todos os símbolos que poderiam, de acordo com as regras da lógica = regras sintéticas para manipulação de símbolos, ser substituídos por ela. [Cf. 3.344.]
O que simboliza em um símbolo é o que é comum a todos os símbolos que poderiam, de acordo com as regras da lógica = regras sintéticas para manipulação de símbolos, ser substituídos por ela. [Cf. 3.344.]
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Funções lógicas todas pressupõem umas às outras. Assim como podemos ver que ~p não tem sentido, se p não tem nenhum; então também podemos dizer p não tem se ~p não tem. O caso é bem diferente com 𝜙a e a: pois aqui a tem significado independentemente de 𝜙a, ainda que 𝜙a pressuponha isso.
Funções lógicas todas pressupõem umas às outras. Assim como podemos ver que ~p não tem sentido, se p não tem nenhum; então também podemos dizer p não tem se ~p não tem. O caso é bem diferente com ϕa e a: pois aqui a tem significado independentemente de ϕa, ainda que ϕa pressuponha isso.


As constantes lógicas parecem ser símbolos-complexos, mas, por outro lado, elas podem ser intercambiadas umas pelas outras. Elas não são, portanto, realmente complexas; o que simboliza é simplesmente a forma geral em que elas são combinadas.
As constantes lógicas parecem ser símbolos-complexos, mas, por outro lado, elas podem ser intercambiadas umas pelas outras. Elas não são, portanto, realmente complexas; o que simboliza é simplesmente a forma geral em que elas são combinadas.